O estilista Valentino convidou a cineasta para encenar a famosa ópera de Verdi e ofereceu a produção à Ópera de Roma, assinando ele próprio os vestidos da protagonista
Estreia amanhã na Ópera de Roma uma nova produção de La Traviata, de Giuseppe Verdi. A notícia é que a encenação cabe à realizadora Sofia Coppola, na sua estreia em ópera; e que os figurinos saíram da casa Valentino, sendo os da protagonista, Violetta Valéry - que irá exibir quatro vestidos ao longo da ópera - desenhados pelo próprio Valentino Garavani, nome mítico da moda italiana - de quem partiu, aliás, toda a ideia. A fundação com o seu nome, bem como a casa Valentino, hoje presidida por Giancarlo Gemmetti, asseguram financeiramente a produção.
Há quatro anos, Olivia Giovetti, uma jornalista norte-americana de música clássica, num artigo surgido no site da rádio clássica WQXR, incluía Sofia Coppola entre dez realizadores que deveriam encenar ópera. E a grande razão para tal era o talento de que dera mostras, no filme Marie Antoinette (de 2006), em fundir extroversão e extravagância com intimismo e introspeção. Parece que profetizava!
"Quando Valentino me convidou, pensei de imediato: "Não posso recusar!"", confessou Sofia Cop- pola, afirmando ainda que a sua resolução se vira cimentada pelo facto de a ópera ter Paris por cenário, onde Sofia vive parte do ano, e pela experiência com Marie Antoinette.
O interesse do mundo da ópera em Sofia Coppola já data de 2007, quando a Ópera de Montpellier (não por acaso em França, um ano depois de Marie Antoinette) anunciou que ela iria encenar a Manon Lescaut, de Puccini, na temporada 2009-10, mas tal seria desmentido pelos representantes da realizadora. Filha de Francis Ford, Sofia tem música nos genes: o avô Carmine era flautista, maestro e compositor e o tio-avô Anton é maestro. Por outro lado, é inegável que a cinematografia do pai contém bastantes elementos operáticos.
O toque de Valentino
Foi igualmente a memória da Marie Antoinette uma das justificativas para Valentino escolher pessoalmente Sofia para encenar a "sua" La Traviata, pois, segundo afirmou, "ela demonstrou uma particular sensibilidade estética e musical, em equilíbrio entre o classicismo e a modernidade", revelando ainda a certeza de que saberá "harmonizar o tradicional e o glamoroso com o toque moderno e surpreendente que tornará a sua encenação algo de muito especial".
A respeito de Violetta Valéry, a heroína da ópera, Valentino classifica-a de "o expoente do glamour trágico". Desenhar figurinos para ela foi "a concretização de um velho sonho". Violetta, disse, "tem os dias contados e porém, adora sair e dançar: bailes, roleta, glamour e desespero sucedem-se, e, por fim, a morte. Perfeição!", remata. Dos quatro vestidos que concebeu apenas revela: "Ela adora luxo, joias e roupas vistosas. Tentei agradar-lhe..."
No secretismo quase total que rodeia a produção, palavras soltas como "elegância", "beleza", "tradicional, mas com incisividade", "intimista", "subtileza" e "centrada nas emoções de uma pessoa" tentam revelar algo do que se prepara.
Ópera em tempos sombrios
Para a Ópera de Roma, esta produção é um verdadeiro "maná dos céus", pois traz-lhe um (mais do que esperado) máximo rendimento a partir de um diminuto investimento, já que a produção é financiada pela Fundação Valentino Garavani. As 15 récitas programadas até 30 de junho estão todas praticamente esgotadas, prevendo-se o maior êxito de bilheteira desde que há Ópera de Roma (1880).
O teatro, como praticamente todos os seus pares "entes líricos" (conjunto de 14 teatros subsidiados pelo Estado), atravessa momentos difíceis, cuja face mais polémica foi a decisão, no outono de 2014, de despedir a orquestra e o coro e recontratá-los como prestadores de serviços, decisão essa que precipitou a saída do consagrado maestro Riccardo Muti, nomeado em 2008 como "maestro vitalício" para Roma, justificada pela "demasiada instabilidade" no interior do teatro. O diretor do teatro é, desde dezembro de 2013, Carlo Fuortes, um dos mais renomados gestores culturais italianos, e o seu trabalho de saneamento económico tem sido amplamente elogiado (recentemente, foi chamado a "apagar" o fogo que ameaçava extinguir a famosa temporada de ópera da Arena de Verona).
E a coroar a unanimidade à volta da escolha de Sofia, Fuortes revelou que já há alguns anos abordara a realizadora para encenar o Così Fan Tutte, de Mozart - provavelmente em Bari, bem próximo das raízes familiares dos Coppola (a Basilicata).
No elenco desta La Traviata estão os sopranos Francesca Dotto (1.º elenco) e Maria Grazia Schiavo (2.º elenco) como Violetta e os tenores Antonio Poli/Arturo Chacón-Cruz no papel de Alfredo Germont. O maestro será Jader Bignamini, um habitué do Festival Verdi de Parma.