Rodrigo Duterte seduziu eleitores com discurso radical contra a criminalidade e a pobreza - os dois principais problemas no país.
"Ditador? Sim, serei um ditador contra todos aqueles que se portam mal, os criminosos, os traficantes de drogas. Para esses, as coisas vão ficar muito difíceis", declarou ontem Rodrigo Duterte, o novo presidente das Filipinas.
Na campanha, Duterte prometera "chacinar os maus" em linha com a atuação que seguiu nos períodos em que presidiu à câmara de Davao, uma das principais cidades do país, onde forjou a reputação de implacável na luta contra o crime e ganhou o cognome de "o carrasco". É neste período que o novo presidente filipino chegou a advogar a execução extrajudicial de criminosos, o que tem de ser entendido no quadro de violência generalizada daquela cidade.
Segundo dados das autoridades filipinas, Davao foi a cidade onde, entre 2010 e 2015, se verificou o maior número de homicídios e o segundo maior número de violações para o mesmo período. De acordo com uma notícia publicado na edição de 2 de abril do The Philippine Star, foram cometidos 1032 homicídios e 843 violações em Davao. A população da cidade é de 1,5 milhões de pessoas.
Também conhecido pela alcunha de "Digong", Duterte, de 71 anos, fez a "promessa solene", nas suas próprias palavras, de "extirpar a criminalidade" nas Filipinas no prazo de três a seis meses. O que é considerado como impossível pelos críticos e por fontes policiais citadas na referida notícia do The Philippine Star. Mas na conferência de imprensa de ontem, o novo presidente insistiu naquela tecla, declarando ser seu dever "cuidar do país. Claro que terei em consideração os direitos humanos... mas ninguém me vai fazer parar. Nem mesmo as Nações Unidas".
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Além dos elevados níveis de criminalidade, as Filipinas apresenta ainda uma realidade social marcada por profundas assimetrias. O Produto Interno Bruto (PIB), após ter atingido um máximo de 7,1% em 2013, segundo números do Bando Asiático para o Desenvolvimento (ADB, na sigla em inglês), tem declinado, ficando-se pelos 5,8% em 2015. E embora a taxa de crescimento seja apreciável, na análise do ADB, não tem gerado empregos suficientes para produzir impacto relevante na taxa de pobreza. No final de 2013, 25,2% de uma população total de 98,4 milhões vivia abaixo da linha de pobreza.
Além das presidenciais, os filipinos votaram ainda em eleições legislativas, provinciais e locais, estando inscritos 55 735 757 eleitores. O presidente é eleito por maioria simples.
Num comentário à eleição de Duterte, o presidente cessante, Benigno Aquino, através de um porta-voz, declarou que "o rumo da boa governação está definido". O principal adversário do novo presidente, o ministro do Interior, Mar Roxas, reconheceu a derrota numa curta declaração em que, tratando Duterte pela sua alcunha, afirmou: "a tua vitória é a vitória do nosso povo e do nosso país". Ontem, ao final do dia, quando estavam contabilizados 90% dos votos, "Digong" tinha uma vantagem de mais de seis milhões de votos sobre Roxas, recolhendo 15 758 861 votos (38,53%) contra 9 590 383 (23,45%) para este. Em terceiro lugar, surgia a candidata independente Grace Poe, com 8 854 580 votos (21,65%). Poe causou surpresa nas eleições de 2013 para o Senado, quando foi a candidata mais votada.
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O presidente eleito era o candidato do Partido Democrático Filipino-Poder Popular, resultado da fusão destas duas organizações, criadas entre final dos anos 70 e início dos anos 80 para combater o regime autocrático de Ferdinand Marcos.
Segundo diferentes media filipinos, Duterte estaria a desenvolver contactos para formar o novo governo - o sistema político é presidencialista nas Filipinas -, podendo contar com a colaboração de pessoas que estiveram com ele na câmara de Davao, além de amigos de infância. Entre estes, Jesus Dureza, antigo colega de escola que Duterte não cessou de elogiar na campanha, será responsável pelas negociações com os independentistas muçulmanos da região de Mindanao, onde persiste uma guerrilha residual. Outro amigo de infância, o empresário Carlos Dominguez, ficará com a pasta das Finanças ou com a dos Transportes e Comunicações. Esta última é considerada muito sensível pelo grau de corrupção que lhe está associado, notava ontem o diário em inglês Inquirer. O mesmo título antecipava ainda que algumas chefias militares, atuais ou do passado, serão chamadas ao executivo.