Contra as ordens da polícia, quatro mergulhadores finlandeses reuniram uma equipa de 27 pessoas para recuperar os corpos de dois compatriotas que morreram afogados, a mais de 110 metros de profundidade, na Noruega
Dos cinco mergulhadores finlandeses que decidiram explorar o profundo sistema de cavernas subaquáticas da Plura, na Noruega, em fevereiro de 2014, apenas três sobreviveram. Dois morreram a mais de 100 metros de profundidade. E se não fosse a valentia de quatro compatriotas - os três sobreviventes e um amigo -, os seus corpos não teriam sido recuperados. Mesmo contra as ordens das autoridades norueguesas, que consideravam a operação demasiado perigosa, resgataram os corpos sete semanas após a tragédia. Um ato heroico, retratado num documentário lançado agora na Finlândia.
No dia 6 de fevereiro de 2014, dois mergulhadores fizeram um buraco no gelo da Plura e entraram na água. Duas horas depois, seguiram outros três amigos. Os cinco iriam percorrer meio quilómetro na lagoa, até chegarem a uma longa caverna. Conta a BBC que se o mergulhador for "altamente treinado e experiente - e insaciavelmente curioso -", pode mergulhar mais fundo, por um trilho estreito e difícil, muito escuro e com água bastante gelada. Depois de passar a fossa, chegará à caverna de Steinugleflaget. E cerca de 90 metros acima encontrará a saída.
Patrik Grönqvist, que tinha descoberto a passagem no ano anterior, foi o primeiro avançar, acompanhado de Jari Huotarinen. A viagem adivinhava-se difícil: o mergulho seria de cinco horas, auxiliado por scooters submarinas, a profundidades de mais de 130 metros. Quando chegou aos 110, Grönqvist percebeu que Huotarinen não ia atrás de si. Voltou para trás e encontrou o amigo preso numa zona estreita da caverna. Tentou libertá-lo, mas não conseguiu: Jari morreu à sua frente.
Sem saberem o que estava a acontecer, os outros três amigos avançaram. Vesa Rantanen foi o primeiro a entrar na água. Encontrou o cadáver do compatriota, mas também não o conseguiu libertar. Mais tarde, soube que quando passava pelo amigo, o mergulhador que seguia atrás de si, Jari Uusimaki, estava a passar dificuldades. O último, Kai Kankanen, tentou ajudar Uusimaki, mas não conseguiu e este também faleceu.
Na sequência do acidente, a Plura foi encerrada e os três sobreviventes foram hospitalizados com a chamada doença da descompressão. Duas semanas depois, Sami Paakkarinen - que tinha feito a primeira travessia com Patrik Grönqvist -, dois outros mergulhadores britânicos estavam prontos para recuperar os corpos. Mas, como era muito arriscada, a polícia norueguesa cancelou a operação. Contudo, Paakkarinen não aceitava a ideia de deixar os corpos dos amigos na Noruega. Tinha de fazer alguma coisa, disse à BBC.
Os três sobreviventes juntaram-se. Planearam tudo em segredo, pois, se descobrisse, a polícia impediria o resgate. Era um dos "mergulhos mais difíceis" que poderiam fazer. Ninguém conhecia melhor o local, mas surgia uma questão: como reagiriam quando encontrassem as vítimas? Um pequeno erro podia conduzir a mais uma tragédia. Prepararam-se emocionalmente e juntaram uma equipa de 27 pessoas para uma operação de cinco dias.
Duas equipas de mergulhadores ficaram nas extremidades, enquanto Grönqvist, Paakkarinen e Kankanen mergulharam até à zona mais profunda. Vesa, que ainda estava em recuperação, coordenou a operação da superfície. Passaram um dia a preparar o equipamento. Uma bolsa de ar permitia-lhes parar, descansar e até comer. Só ao terceiro dia começou efetivamente o resgate. Depois de descer 85 metros, Kankanen regressou. Tinha dormido mal e não estava preparado. Grönqvist e Paakkarinen continuaram a descer sozinhos. Em dois dias, e com a ajuda de outro mergulhador, resgataram os corpos. Foram 101 horas de mergulho.
No final, tiveram de chamar as autoridades. Segundo Paakkarinen, embora a polícia estivesse satisfeita com o resgate dos corpos, eles tinham quebrado várias regras. Entretanto, as cavernas Plura foram novamente abertas, mas ainda ninguém voltou a tentar fazer a travessia. Apesar de tudo, diz a BBC, Grönqvist, Rantanen, Kankanen e Paakkarinen continuam a apreciar o desporto.