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Autor Tópico: Paulo Portas já era. Direita tem uma Cinderela todo-o-terreno  (Lida 540 vezes)

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Offline Nelito

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O DN esteve na estreia de Assunção Cristas com as bases do partido, que incluiu uma prova de fogo, na concelhia de Nuno Melo, em Famalicão. Dois dias a fazer política ao ritmo de campanha eleitoral

Lisboa, Braga, Famalicão. Banqueiros, empresários, industriais, militantes, deputados, família. Dois dias hiperativos da nova presidente do CDS que terminaram num megajantar com mais de 600 militantes, em Vila Nova de Famalicão. Já pouco se fala de Paulo Portas, ninguém chora o carismático ex-líder que durante 16 anos foi o rosto dos democratas-cristãos. Assunção Cristas impõe um novo estilo e conquista fãs.

"Princípio Cinderela". Esta foi a expressão com que a nova presidente do CDS encarou os membros do mais importante órgão de decisão partidária, à entrada da sua primeira reunião da comissão política nacional. "Como é a primeira vez, dou um bocadinho de tolerância, mas à meia-noite acabamos. Eu sou pelo "princípio Cinderela"", assinalou. Entre sorrisos e encolher de ombros, os dirigentes iam subindo ordeiramente as escadas do Largo do Caldas. "Isto mudou mesmo", ouvia-se sussurrar pelas históricas paredes da sede centrista.

Assunção Cristas já começou a impor novas tradições no partido, com planeamentos a longo prazo (com Paulo Portas às vezes nem de véspera se tinha a agenda certa), reuniões curtas e nunca fora de horas. "Tento sempre gerir o tempo para conseguir estar o máximo de tempo com a minha família", justifica. Quatro filhos, Maria do Mar, José Maria, Vicente e Maria da Luz (a Luzinha), com idades entre os 14 e os 2 anos, esperam-na em casa. E Tiago, claro, o marido que tanto a tem "apoiado e impulsionado na sua carreira política e profissional", como nos confidencia Rui Lopes da Silva, seu assessor mais próximo.

A reunião foi marcada para as 21.30 para "dar tempo de jantar com a família", admite "e é assim que vai passar a ser. Sempre com o final antes da meia-noite. Porque essa é a hora em que Assunção deixa de ser a "presidente do CDS" e se "transforma" em mãe e mulher. Sem magia, mas sim por sua determinação. "Tento sempre contrabalançar. Nesta semana estive nos Açores dois dias, agora não há dormidas fora. Antes do congresso andei na volta ao país, depois consegui fazer dez dias de férias de Páscoa, com a família."

Nessa quinta-feira, o dia de Assunção tinha começado cedo, pelas 09.30, a receber banqueiros da Associação Portuguesa de Bancos, com Faria de Oliveira, presidente, a dirigir uma delegação composta por José de Matos, o presidente do conselho de administração da CGD, e Miguel Maia, vice-presidente do BCP. O encontro foi pedido pela APB e, obviamente, o sistema financeiro está na ordem do dia. Recebe-os na sua nova sala pintada de fresco, azul-céu, onde já estão Adolfo Mesquita Nunes, que se destacou como secretário de Estado do Turismo, e Cecília Meireles, a deputada com a pasta da Banca.

Os novos ventos que sopram no Caldas não se resumem às rotinas e horários. Pela primeira vez na história do partido, um presidente deixou de utilizar o gabinete nas traseiras do piso, chamado bunker, pois não tem rede de telemóvel e conta-se que era o mais seguro, à prova de "escutas" e de ataques de "radicais". A nova líder mudou-se para a sala da frente, virada para o Largo Adelino Amaro da Costa, com portadas e janelas amplas por onde entram holofotes de luz. "Felizmente hoje temos de ser à prova de muitas coisas, mas dessas não", diz Assunção.

O dia ainda vai longe de terminar e o próximo será no distrito de Braga, com visitas a fábricas, encontros com empresários e megajantar com militantes, em terreno que lhe podia ser hostil (mas não foi mesmo), Famalicão, terra natal de Nuno Melo, que quase lhe disputou a liderança do partido. "Estou em campanha, sim. Pela afirmação do CDS. A recolha de sensibilidades é uma preocupação e será uma constante. E isso será do primeiro ao último dia", atalha de imediato, quando lhe falamos na agenda recheada de atividades. Quanto à "coincidência feliz", como a apelidou Rui Lopes da Silva, do destino famalicense, Assunção refuta que seja uma "prova de fogo" ou uma "provocação" do aparelho partidária para quem ainda é uma quase estranha. "Eles pediram-me logo para lá ir, no congresso", sublinha.

Nesta altura estamos no automóvel que herdou de Paulo Portas, juntamente com um feliz motorista, Ricardo, que não esconde a satisfação. "Andávamos sempre a acelerar, por causa dos atrasos, agora estamos sempre a horas", conta o homem.

Assunção olha para as mensagens do iPhone e suspira. "A quantidade de coisas a que nos pedem para reagir é impressionante. Grande parte dispensava mesmo. Tantas coisas importantes para tratar. Mas, enfim, tenho de me habituar. Faz parte de estar na oposição", desabafa. Era o dia das bofetadas prometidas pelo então ministro da Cultura e o rodopio de comentaristas marcava a atualidade. Este era um caso em que não havia hesitação na reação política. O CDS atirou para o João Rambo Soares (como lhe chamou a brincar um dos assessores centristas) o sisudo António Carlos Monteiro, ex-secretário-geral.

Depois da reunião regressou de novo ao Caldas, para um almoço de trabalho, num novo espaço que também já organizou, com Miguel Morais Leitão (vogal da comissão executiva e ex-ministro da Economia), Mariana França Gouveia (professora universitária e nova cara na comissão política) e Ana Rita Bessa (nova deputada). "Vais ser a primeira estrear a nossa nova varandinha", dizia Assunção para Ana Rita Bessa, enquanto subiam as escadarias de pedra em ritmo acelerado. A "varandinha" é, de facto, acolhedora e também cheia de luz, numa divisão contígua à copa, que era uma espécie de marquise no passado. Uma pequena mesa redonda, toalha branca e uma tarte de pato com salada estão à sua espera. Mas o menu mais importante é o tema de conversa, a educação. "É uma área em que queremos contribuir para a estabilidade. Queremos identificar pontos em que é possível acordos com os outros partidos. Sabemos que a esquerda não tolera o ensino privado, mas 90% dos alunos estão na escola pública e aí acreditamos que pode ser possível trabalhar pela estabilidade e estabelecer pontes de diálogo. Não queremos aprofundar mais as distâncias", justifica a líder centrista. À hora do café as três mulheres acabaram por confidenciar algumas "experiências educativas" originais, nas respetivas casas, perante o olhar sorridente e meio atónito de Morais Leitão. "Eu estabeleci uma tabela de incentivos/penalizações financeiras de acordo com os resultados académicos dos meus filhos", contava Ana Rita Bessa, recebendo acenos de concordância das cabeças de Cristas e de França Gouveia. "Será que funciona com as meias no chão do quarto?", questionava, a rir, Assunção.

Mas o tempo aperta e é preciso regressar ao Parlamento, em cujo debate do dia- Educação, precisamente - Assunção fazia questão de estar presente. Deixa a assembleia por volta das seis horas, porque quer estar com a família, ainda um bom bocado, antes da reunião da comissão política. A reportagem para ali. "A porta da minha casa é o limite para a minha exposição pública", justifica. Encontramo-nos só mais tarde, no Caldas, para a sua primeira reunião da comissão política nacional. Como prometido terminou à meia-noite e a essa hora ouviram-se aplausos no piso de baixo. "Foi para assinalar o fim dos trabalhos", revela, descontraído, João Condeixa.

No dia seguinte, sexta-feira, pelas nove de manhã, lá estava a mãe Cristas, à porta de sua casa, com Maria da Luz pela mão. "Fica na casa da minha mãe que é perto", explica. Os pais têm, ao todo, 15 netos e a sua casa é a base da família. Os outros três filhos já seguiram para a escola, rua abaixo, a pouco menos de 300 metros. A escola é privada, mas para o ano a mais velha vai seguir para uma escola pública.

Antes de rumar a norte, ainda tempo para uma rápida passagem pela Assembleia, no dia em que se ia discutir a lei do PS de proteção às lojas históricas. "Hoje vou bater forte nesta proposta", disse-lhe Jorge Moreira da Silva quando se cruzaram no corredor. "Acho muito bem", concordou Assunção. "Para nós isto é um álibi para reverter a lei das rendas e favorecer certos presidentes de câmara [Lisboa]", afiançava o deputado do PSD que, tal como a própria Assunção Cristas, tem sido dado como putativo candidato à autarquia da capital.

À noite, no jantar com militantes, a presidente do CDS destaca este tema, chamando à iniciativa uma "extraordinária encomenda à medida do presidente da Câmara de Lisboa [Fernando Medina, do PS]" bem ao estilo "ardiloso, à socialista". E a "corte" que lhe tem sido lançada por Costa? Encolhe os ombros e, com sorriso travesso, exclama: "Deve ter muita sorte, deve!"

Em Famalicão tem à sua espera para almoçar, na aconchegante sala de refeições da Casa do Outeirinho, com uma lareira crepitante a aromatizar o ambiente, cerca de uma centena de empresários da região. Nuno Melo faz as honras da casa e as apresentações. O mesmo fez, à noite, no mega jantar com mais de 600 militantes do seu concelho, encaminhando, como se de uma noiva se tratasse, Assunção Cristas, mesa a mesa, a agradecer a presença de todos. "O Nuno é o nosso menino, mas o partido fez uma escolha sábia. A professora Assunção tem muito mérito e é de carne e osso, como todos nós, com família e vida profissional", caucionava Ana Oliveira, uma ex-autarca local, instrutora de equitação e "cavaleira de obstáculos".

O contrarrelógio disparou a partir dali: visita a uma transportadora (para ouvir in loco sobre o impacto do aumento dos combustíveis); à Made (in)cubar, um núcleo/embrião de novas empresas ("as empresas são a base do crescimento económico", sublinhou Assunção); a uma grande exportadora famalicense do setor têxtil, a Riopele, exemplo de uma empresa familiar que soube "resistir" à crise; e a uma multinacional, a Bosh, em Braga, onde, contou depois ao DN, recebeu um apelo "à estabilidade das políticas nacionais" e a leis laborais mais protetoras da gestão empresarial. Pelo meio da frenética tarde trocou o elegantes sapatos estilo scarpin (salto agulha) por uns confortáveis derbie, nunca deixando transparecer sinais de cansaço e sempre ouvindo atentamente todos os interlocutores. "Tinha prometido na moção que levei ao congresso mais contacto com as bases, distrito a distrito. Mais do que discursos e jantares interessa-me ouvir o que as pessoas têm para dizer", salienta. Presidência aberta? "Sim, podemos chamar-lhe isso. Quero sedimentar uma relação de proximidade. Fiz isso quando estava no ministério. Não há nada mais eficaz do que ir para o terreno e falar com as pessoas das várias áreas", diz.

A máquina do partido, liderada em Braga por Altino Bessa, fez honra em oferecer à nova líder uma receção apoteótica e Assunção soube bem seduzir os militantes. Sempre ao lado de Melo, concedendo dezenas de selfies e deixando depositar no seu rosto outros tantos beijinhos. Um Melo inspirado aqueceu, com o seu discurso, os militantes, mas foi a enérgica política Cristas que os incendiou e os levantou em aplausos. Não se falou todo o dia, nem em nenhum dos discursos dessa noite, de Paulo Portas. "As mulheres têm esse condão. Fazer pensar mais no futuro do que no passado", concluiu Ana Oliveira, a cavaleira que não faltou ao jantar. Faltavam cinco minutos para as três da manhã, quando o motorista Ricardo a deixou à porta de casa. O fim de semana ia ser em família, sem agenda partidária.
PORTA-TE MAL MAS COM ESTILO