O presidente da Câmara do Porto criticou, esta segunda-feira, o pacote de medidas do Governo para o setor da habitação. Rui Moreira entende que o Executivo deu mostras de uma "obsessão centralista", expressa através de uma "pulsão bolivariana" que, a seu ver, se tornará "autodestrutiva". O autarca acredita que nem as compensações pagas aos proprietários - que descreveu como "voluntarismo liberal de caráter fiscal" - anularão os efeitos negativos de um pacote condenado a "falhar".
"O problema da habitação não se resolve perseguindo os senhorios - pequenos investidores, muitos deles -, congelando rendas ou forçando o arrendamento", afirmou o presidente da Câmara do Porto, em comunicado. "Essas medidas apenas afastam os aforradores do investimento em habitação e provocam a degradação do parque habitacional das cidades, tal como se demonstrou durante o Estado Novo", acrescentou.
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"Ao fim de sete anos de inação, de propostas vãs, de promessas nunca concretizadas, de medidas legislativas inócuas, eis que o Governo, sem ouvir as autarquias, decidiu avocar, por confisco, a política de habitação", acusou Rui Moreira. E, referindo-se ao pacote apresentado, vaticinou: "Não temos dúvidas de que o todo falhará, independentemente da bondade de uma ou outra parte".
O autarca portuense classificou as soluções apresentadas pelo Governo na última quinta-feira como "uma "salada de frutas de medidas avulsas". Considerando que estas demonstram a "nova veia intervencionista" do Executivo, sublinhou que tal "obsessão centralista" exigiria, pelo menos, "coerência": "Uma coerência quiçá inatingível quando há uma pulsão bolivariana autodestrutiva, perfumada com um voluntarismo liberal de caráter fiscal", atirou.
No entender de Moreira, a solução deveria passar pelo aumento da oferta de habitação. "Para isso, o Estado devia ter a capacidade de construir habitação pública e de atrair o investimento privado com medidas fiscais apropriadas, com a disponibilização de terrenos (o que tarda em fazer) e com medidas que garantam a estabilidade legislativa e reduzam o risco político", defendeu.
Ao "estatizar" habitação, Governo tirou "confiança" a privados
O presidente da Câmara do Porto sustentou também que o facto de haver medidas que transpõem "o ónus social que cabe ao Estado" para os pequenos proprietários fará com que estes passem a nutrir "um ainda maior desinteresse" em serem "parceiros estratégicos" do poder público central.
Já a extinção de uma atividade "tão relevante" como o alojamento local, bem como a promoção do "arrendamento forçado de propriedade privada" ou o "congelamento das rendas em novos contratos", contribuirão para minar a "confiança" dos privados, argumentou o autarca. "Esse é mesmo o efeito negativo irreversível que este plano já criou", referiu, lembrando que os privados representam "a esmagadora proporção do investimento em habitação".
Moreira salientou que, se o Governo quer "estatizar todas as políticas na área da habitação", deveria ser "consequente" e "confiscar o parque habitacional dos municípios, assumindo a sua gestão".
Autarquias é que têm mais "saber acumulado"
O autarca da Invicta lamentou as opções do Governo, lembrando que, no que respeita à habitação, são os municípios quem tem uma "intervenção histórica" e um "saber acumulado assente na diversidade". Também vincou que, no Porto, nos últimos sete anos, o Estado - através do Instituto da Habitação e Reabilitação Urbana (IHRU) -, não construiu "uma única habitação social" nem promoveu "um só projeto de renda acessível".
"Retirando aos municípios os instrumentos de regulação que estes vinham assumindo, sobrepondo-se aos PDM aprovados democrática e localmente, o Governo passa a tudo definir sem qualquer auscultação. E como é tradição nos modelos centralistas, fá-lo beneficiando os municípios que nada fizeram em matéria de habitação", argumentou Rui Moreira.
Já o Porto sai, segundo o autarca, penalizado. Isto porque se trata da cidade com "o maior parque de habitação pública (que abrange cerca de 13% da população residente) e, seguramente, um dos melhores em estado de conservação", referiu. Moreira alegou que algumas das medidas mais positivas do pacote do Executivo "replicam" soluções já aplicadas na Invicta.