No espaço de um ano, a indústria da construção conseguiu atrair mais de 26 mil novos trabalhadores. O setor emprega agora quase 325 mil pessoas, o valor mais alto dos últimos dez anos. Este incremento é o resultado da "reconversão de trabalhadores de outros setores de atividade, mais afetados pela pandemia, e pelo recurso à mão-de-obra de outros países", com foco naqueles onde as empresas da construção desenvolvem a sua atividade internacional, como os PALOP, diz Manuel Reis Campos, presidente da associação do setor AICCOPN. Mas a entrada desses profissionais está longe de resolver o problema de escassez de mão-de-obra sentida pelas empresas. Continuam a faltar 80 mil trabalhadores para responder ao fluxo de obras que se avizinha para os próximos anos, nomeadamente, as do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR).
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"A falta de mão-de-obra, estimada em cerca de 80 mil trabalhadores, é um dos principais obstáculos à atividade, tendo sido assinalado por 75% das empresas que operam no segmento das obras públicas", aponta Reis Campos. E isto apesar de o emprego no setor ter registado um crescimento homólogo de 9% no terceiro trimestre de 2022, tendo agora na sua alçada 324 900 trabalhadores. Segundo frisa, nesse período, o emprego na indústria da construção "correspondia ao nível mais elevado dos últimos 10 anos".
Preços abrandam
Ao problema da falta de mão-de-obra, para o qual Reis Campos tem vindo sucessivamente a alertar, o setor soma o aumento dos preços das matérias-primas, da energia e dos materiais de construção. É certo que a subida dos preços apresentou um abrandamento nos últimos meses do ano passado e, em alguns materiais, uma estabilização, mas não o suficiente para aliviar as empresas. O último inquérito à situação da indústria da construção efetuado pela AICCOPN revelou que o problema do aumento dos preços das matérias-primas, energia e materiais afeta 73% das empresas que operam no segmento das obras públicas. Já a escassez de matérias-primas e materiais de construção foi o terceiro constrangimento mais assinalado, tendo sido identificado por 43% das construtoras.
Estas dificuldades não impedem o setor de responder ao volume de investimento público projetado até 2026. Reis Campos é perentório: "Há capacidade para concretizar os investimentos". Na realidade, a calendarização e planeamento do PRR, que a construção queria ter visto executada ainda no ano passado, ficou aquém das expectativas. Mas, agora, "estão reunidas todas as condições para que, em 2023, seja possível cumprir o planeamento e assistir-se a um aumento significativo do investimento público, nomeadamente em habitação, cujos investimentos previstos ascendem a 1583 milhões de euros", acredita Reis Campos.
Investimentos em perspetiva
Na sua opinião, "a correta e expedita utilização das verbas do PRR, que totalizam cerca de 16 mil milhões de euros, são fundamentais na recuperação económica e no posicionamento competitivo do país". O Programa de Apoio ao Acesso à Habitação, que pretende dar resposta a pelo menos 26 mil famílias sem habitação condigna, já conta com 216 municípios com as Estratégias Locais de Habitação aprovadas, adianta. O passo seguinte, que sublinha de "fundamental", é acelerar os processos de tomada de decisão em todas as suas fases. A indústria está preparada e, por isso, é "impensável considerar a hipótese do PRR não se concretizar como planeado". Estes investimentos públicos são da maior importância para o setor que, como toda a economia, debate-se com um período de grande incerteza face aos riscos de uma possível escalada da guerra na Ucrânia ou de um crescimento superior ao expectável da inflação e das taxas de juro.
A indústria da construção e imobiliário fechou o exercício de 2022 a registar um crescimento de 3,4% do valor bruto da construção, que totalizou cerca de 19148 milhões de euros. O segmento da engenharia civil, apesar dos atrasos no lançamento dos investimentos públicos previstos, terá aumentado o valor bruto da produção em 4,5%, devido sobretudo aos níveis de contratação ocorridos em 2020 e 2021, que ascenderam a 7759 milhões. Para Reis Campos, esta performance comprova "a elevada resiliência das empresas da fileira da construção e do imobiliário, que têm conseguido superar os impactos das sucessivas crises". O presidente da AICCOPN lembra que enfrentaram eventos globais, como a guerra na Ucrânia, o crescimento acelerado da inflação e o aumento das taxas de juro, e problemas setoriais, como a falta de mão-de-obra qualificada, os aumentos das matérias-primas, da energia e dos materiais de construção.