Seis meses depois da derrocada de um aterro basco foi encontrada uma das vítimas de uma tragédia inédita.
4 de fevereiro de 2020. Os trabalhadores do aterro industrial de Zaldíbar, a 40 km de Bilbao, no País Basco, percebem movimentos de terra estranhos e detetam fissuras. Mas estavam longe de imaginar o que iria acontecer dois dias depois: uma avalanche, duas mortes e o escândalo do negócio que se faz com o lixo.
6 de fevereiro de 2020. 16 horas. Joaquín Beltrán, chefe da empresa que organizava os resíduos dentro do aterro, sentiu a terra começar a tremer e gritou ao irmão, Txisko, e ao colega, Rodolfo, que fugissem rapidamente dali com as escavadoras. As máquinas acabariam por ser o refúgio que os salvaria durante os 40 segundos em que viram Beltrán entrar no carro para avisar Alberto Sololuze. Acima deles, aproximava-se uma avalanche de lixo. Não chegou a tempo. O aterro, que acolhia anualmente meio milhão de toneladas de resíduos não urbanos, tinha colapsado. Uma montanha de lixo que chegaria para cobrir quatro campos de futebol desmoronou-se colina abaixo, arrastando os trabalhadores e invadindo a autoestrada AP-8, que liga Bilbao a São Sebastião.
As buscas arrancaram imediatamente para logo serem suspensas: entre os detritos estavam, sem autorização sanitária, materiais tóxicos, como amianto, e os gases do lixo provocaram vários incêndios contaminando gravemente o ar, ao ponto de várias localidades vizinhas terem sido colocadas em alerta. Pediu-se a 48 mil pessoas que não abrissem janelas nem fizessem atividades ao ar livre. Somava-se a instabilidade do terreno.
A tensão entre os familiares dos desaparecidos e o Governo Basco não parava de crescer, com o presidente regional, Iñigo Urkullu, então em campanha eleitoral, a demorar seis dias a visitar o local da tragédia. Num primeiro momento, o executivo basco hesitou: o aterro era propriedade privada, da Verter Recycling 2002. Pressionado, acabou por alocar 13 milhões de euros na ampliação do aterro e na busca dos desaparecidos e evitar uma segunda tragédia. Entretanto, três altos cargos da empresa foram acusados de homicídio por negligência, ficando em liberdade condicional.
A chegada da pandemia de covid-19 e a nova suspensão dos trabalhos fez as famílias Sololuze e Beltrán recear pelo esquecimento, Mas as autoridades voltaram à atividade em finais de março e encontrariam o carro de Alberto poucos dias depois.
Passado meio ano, a família Sololuze pode fazer o seu luto: os restos mortais de Alberto foram encontrados a 23 metros de profundidade. Um osso envolvido em restos de roupa, uma câmara, um relógio, uns óculos de sol e um cadeado confirmados como pertencendo ao trabalhador de 62 anos. Apesar das 12 máquinas e centena de pessoas envolvidas diariamente nas buscas, ainda não há sinais de Beltrán, que morreu ao tentar salvar outros. Nem responsabilidades políticas atribuídas, recordaria a plataforma Zaldibar Argitu, que acredita que a tragédia teria sido evitada não fossem as "práticas negligentes" de um "negócio sem escrúpulos".