"Até ao momento, formalmente, há registo de acima de 84 óbitos. Mas depois de sobrevoarmos a zona para perceber o que se passa, tudo indica que poderemos registar mais de mil óbitos".
As palavras do presidente de Moçambique, Filipe Nyusi, refletem o estado em que ficou a joia da coroa moçambicana: a cidade da Beira foi varrida na sexta-feira pelo ciclone Idai, cujo olho, contornado por ventos acima de 190 km/h, rasou o centro. Com ele arrastou vidas e lares, muitos deles de portugueses. E arrasou aldeias com lama, deixando atrás de si a ameaça de epidemias.
O resultado da passagem do Idai começa a revelar-se lentamente, à medida que são restabelecidos os contactos com a região, onde já chega ajuda humanitária. Calcula-se que 80% da zona estejam sem eletricidade, havendo povoações isoladas pela destruição de troços da Nacional 6, que liga a cidade portuária da Beira ao interior e ao Malaui. Haverá, calcula Nyusi, centenas de milhares de pessoas afetadas.
"As águas dos rios Púnguè e Búzi transbordaram fazendo desaparecer aldeias inteiras e isolando comunidades. Veem-se corpos a flutuar, portanto um verdadeiro desastre humanitário de grandes proporções", lamentou o presidente, numa declaração televisiva em que disse haver pessoas refugiadas em telhados e árvores. A Cruz Vermelha falava em 90% da região "destruída".
"Este desastre natural deixou grande parte da zona centro sem energia elétrica. A região também deixou de ter abastecimento de água potável e comunicações, além ter afetado o funcionamento normal dos hospitais, escolas e demais instituições públicas e privadas".
Soma-se aos efeitos diretos do Idai o facto de, no caso da cidade da Beira, a construção se ter feito, ao longo dos anos depois da independência, sobre um leito pantanoso, junto à foz do Púnguè. A existência de canais de drenagem acabou hipotecada pela sobreconstrução, transformando a cidade de cerca de 500 mil habitantes num risco sempre que há inundações.
PORTUGUESES PERDEM CASAS
"Felizmente, até agora, não temos registo de cidadãos portugueses mortos, feridos ou em situação de perigo, mas ainda não conseguimos contactar todos. Infelizmente, temos já notícia de várias dezenas de compatriotas nossos que perderam as suas casas e os seus bens e que se encontram alojados, por exemplo, em unidades hoteleiras ou casas de amigos ou vizinhos", adiantou ontem o ministro dos Negócios Estrangeiros português, Augusto Santos Silva, garantindo estar a acompanhar a situação. Só na Beira viverão mais de 2000 portugueses.
O ciclone Idai decorreu de uma depressão ciclónica que, no início de março, devastou o interior de Moçambique, na zona fronteiriça com o Malaui. Entre os dois países, somaram-se 122 mortos. Ao deslocar-se para o canal de Moçambique, passou a ciclone tropical intenso, com dez vezes mais potência. Varreu a província moçambicana de Sofala e guinou para o Zimbabué. Ali, fez 89 mortos.
"É uma catástrofe. Está tudo destruído. Moçambique nunca enfrentou tamanho desastre", resumia o ministro do Ambiente, Celso Correia, ao aterrar na Beira depois de reaberto o tráfego aéreo, no domingo. A ONU já pediu 35 milhões de euros para ajudar Moçambique.