Em Gandra, Paredes, há uma artéria onde só vivem irmãos. Construíram as casas em talhões oferecidos pelos pais. E a toponímia homenageia o facto.
Há uma rua em Gandra que parece igual a tantas outras, mas não é. Ostenta com orgulho o nome de Rua dos 17 Irmãos. E não se pense que se trata de uma toponímia ao acaso. É que lá vivem mesmo apenas irmãos e as suas famílias. Não os 17, porque alguns nunca chegaram a construir no talhão que lhes foi destinado pelos pais, mas 14.
Adélio Martins e Maria Rosa Costa faleceram há poucos anos. Eram um casal humilde como tantos outros. Trabalharam, sobretudo na agricultura, durante toda a vida, e moraram em habitações arrendadas até fazerem uma casinha própria, há 53 anos, no lugar de Gandra de Moreira. Ao lado, foram comprando parcelas de terreno.
"Era tudo monte", recordam os filhos, que desde jovens ajudavam no campo, andavam à frente dos bois ou aprendiam a fazer broa. Muitos começaram a trabalhar logo aos 13 e 14 anos, coisa habitual na altura.
Podiam ser mais (um faleceu com um ano de idade e a mãe sofreu três abortos), mas são 17. A mais velha tem 64 anos e a mais nova 40 anos. E não há nomes repetidos. Chamam-se Irene, Manuel, Fernando, Elisa, Fátima, Rosa, Nazaré, Maria, Celeste, Luzia, Mário, Eduardo, António, Abel, Leonor, Paulo e Amélia Martins. A família, já de si grande, conta ainda com 22 filhos e oito netos.
"O meu pai tinha aqui vinha, fruta e campos. Mas depois os filhos foram casando e dividiu-se o terreno em parcelas. Fui o primeiro a construir, em 1985", lembra Fernando Martins, o terceiro mais velho. Os irmãos ajudaram, como era típico, e foram construindo também. Quase todos o fizeram. Hoje, só três não moram na rua.
"A maioria mora aqui e vemo-nos com tanta frequência que nem precisamos de ir a casa uns dos outros", brincam. Numa rua circular e sem saída, onde cada carro estranho é notado, as crianças podem jogar à bola e andar de bicicleta e há um ambiente de convívio, sobretudo nas tardes de calor do verão. "Quando os nossos pais eram vivos as crianças acabavam a escola e iam todas para casa dos avós", recorda Elisa Martins.
Uma aldeia só deles
Aquele espaço é praticamente uma aldeia que é só deles. "Se calhar há aldeias com menos gente que a nossa rua", acrescenta Elisa.
A rua mudou. Tinha pomar, vinhas e era de terra batida. Agora é empedrada e tem sobretudo habitação. O nome de Rua dos 17 Irmãos foi colocado há cerca de 12 anos. O objetivo da Junta de Gandra era homenagear um familiar que era sacerdote e chamar à rua Padre Albino Moreira da Costa, dizem os irmãos. "O nosso pai não quis e sugeriu Rua dos 17 Irmãos. Chegaram a enganar-se e puseram Rua dos 17 Filhos, mas ele disse que não soava bem e trocaram", contam. "É a rua mais conhecida de Gandra. Se perguntarem onde é toda a gente sabe", explica Irene Martins, a irmã mais velha.
Histórias engraçadas há algumas, que vão surgindo sempre que têm que dar a morada. "Uma vez fui às Finanças e disse que morava na Rua dos 17 Irmãos. O homem ficou a olhar para mim e perguntou se eram meus tios. Eu disse que não, que nós é que éramos os 17 irmãos", dá como exemplo Irene. "Recentemente perguntaram-me, na Câmara de Paredes, porque se chamava Rua dos 17 Irmãos e eu expliquei que era porque morávamos quase todos aqui. Ficaram surpreendidos", refere também Fernando . "É com muito orgulho que vivo na Rua dos 17 Irmãos", conclui.