São cada vez mais as empresas privadas e as corporações de bombeiros que recusam transportar doentes não urgentes com credencial dos hospitais, ou seja, pagos pelo Serviço Nacional de Saúde (SNS).
O preço tabelado não compensa, sobretudo em trajetos curtos, e as dívidas acumuladas de muitos hospitais tornam o serviço "incomportável", dizem os prestadores. A nível particular, uma viagem curta de ida e volta pode custar 70 euros e muitos doentes estão a ficar sem alternativa.
Este mês, os utentes transportados para consultas e tratamentos no Hospital de S. João, no Porto, pelas ambulâncias "Salvavida" foram avisados, por escrito, pela empresa de que o transporte com credencial cessaria a partir de dia 15. Em causa, refere a carta, estão faturas em atraso relativas ao transporte com credencial. Contactado pelo JN, Paulo Tavares, responsável da empresa, disse que o hospital tem uma fatura pendente de 2016, nenhuma de 2017 e várias desde janeiro deste ano, no valor total de 24 mil euros, o que levou à decisão de parar com o serviço.
O Hospital de S. João nega ter faturas em atraso de 2016 e garante ter tudo pago até julho deste ano. O administrador Renato Matos reconhece que há problemas com o transporte de doentes não urgentes, mas estes devem-se ao valor baixo que está tabelado.
"Os preços não compensam e nos últimos dois anos as empresas têm recusado fazer estes serviços", explicou Renato Matos, adiantando que, nestas situações, recorrem aos bombeiros. Porém, dentro da cidade, o problema mantém-se porque nem os Voluntários do Porto nem os Portuenses transportam com credencial para o S. João, como confirmou o JN. Os primeiros levam 60 euros e os segundos 52,5 euros por ida e volta, a nível particular.
O presidente da Liga Portuguesa de Bombeiros concorda que os valores tabelados não são atrativos, mas garante que o "grande problema é os hospitais deverem muito dinheiro aos bombeiros". Jaime Marta Soares diz que há associações de bombeiros a viver "situações dramáticas" e que o problema não é só no Porto, está a "generalizar-se". Em Viseu, várias corporações recusam transportes entre hospitais.
SITUAÇÃO "INSUSTENTÁVEL"
Também o presidente da Liga Portuguesa de Ambulâncias admite problemas em várias pontos do país. Segundo Martinho Cruel, "o Hospital de Viana atrasa-se sistematicamente nos pagamentos" e "os hospitais de Coimbra não pagam desde janeiro". "É insustentável para as empresas", diz.
Em resposta ao JN, a Unidade Local de Saúde do Alto Minho garante que têm sido feitos pagamentos regulares e mensais às transportadoras. Já o Centro Hospitalar e Universitário de Coimbra admite ter faturas pendentes, por questões de tesouraria e morosidade na conferência de faturas, mas nega atrasos desde janeiro. Diz ainda que, este ano, já pagou quase três milhões de euros aos bombeiros, cerca de metade da despesa anual com transporte de doentes.
A Administração Central do Sistema de Saúde diz desconhecer reclamações na área e garante que monitoriza, de forma permanente, as condições de acesso dos doentes ao transporte não urgente. Em 2017, refere, foram efetuados mais transportes do que em 2016 e os custos subiram sete milhões de euros para um total de 116 milhões.