De desempregada em Portugal a "melhor" do Leste de Inglaterra, enfermeira vila-condense fala da terra que lhe deu oportunidades e um prémio.
"Feliz, muito feliz". Estar nomeada já era "uma honra". Vencer foi a "cereja no topo do bolo". A portuguesa Sílvia Nunes foi eleita a "Melhor Enfermeira" da região Leste de Inglaterra e é uma das cinco "Melhores Enfermeiras de Cuidados de Longa Duração" do Reino Unido, cujos prémios são entregues no próximo dia 30. Sem conseguir emprego em Portugal, foi obrigada a emigrar. Inglaterra trouxe-lhe o sucesso e o reconhecimento. Não guarda rancor. Enfrenta o Brexit "com confiança", mas, se a opção for ter de deixar de ser portuguesa, não hesita: "Vou embora!". Portugal será sempre o seu país.
Natural de Vila do Conde, Sílvia começou a trabalhar nos bombeiros com 18 anos. Fez formação, viu hospitais e unidades de cuidados paliativos. Viu o sofrimento e descobriu uma vocação: queria ajudar. Em 2009, entrou em Enfermagem na Escola Superior de Saúde do Vale do Ave. Acabou o curso em 2013, já convicta da "opção certa". Depois, veio a desilusão. Dezenas de currículos entregues em clínicas, hospitais e unidades de cuidados continuados. Nada. Faltava-lhe a experiência que não a deixavam ter.
No setor, via precariedade, desemprego, competitividade a mais, lares sem enfermeiros e com condições "muito abaixo do desejável", "jovens cheios de valor sem direito a opinar", falta de reconhecimento e de progressão na carreira, desilusão.
Em agosto de 2014, decidiu que ia mudar-se para casa da futura sogra, em Thetford, a 140 quilómetros de Londres. Foi de carro, "às cegas". Falava mal inglês e não tinha emprego, mas acreditou.
"Comecei como auxiliar no lar e fui aprendendo a falar e a escrever". Dez meses depois, veio o PIN, o cartão profissional que lhe permitia trabalhar como enfermeira. Seis meses depois, era enfermeira-chefe e, passados nove meses, vice-diretora do lar Ford Place em Thetford, onde conquistou colegas e residentes.
Foram quatro anos de ascensão rápida, por "puro mérito", "impossível" no seu pequeno Portugal.Lá, os lares têm enfermeiros 24 horas por dia e toda a maquinaria. "São muito mais do que um lar", diz Sílvia, que, para 43 doentes, têm 65 membros na equipa.
Introduziu mudanças na nutrição, reforçou os laticínios, a fruta e o mel para compensar o corte nos apoios públicos para suplementos alimentares e cada doente passou a ter "comida personalizada" e "cuidados únicos". Ajustou medicação, deu carinho e atenção - que "muitas vezes é o melhor remédio" -, ouviu a opinião de todos.
E agora?
Os resultados deram frutos. Quatro anos depois, num trabalho que frisa ser "de equipa" e beneficiar do "grande apoio dos patrões", que "nunca negam material" - a Stow Healthcare que tem cinco lares -, o Ford Place foi avaliado com nota máxima pelo regulador. "Ouvimos toda a gente e aprendemos com todos, sejam novos ou mais velhos".
Em Inglaterra, ao contrário de Portugal, "um enfermeiro é como ouro: algo raro e importante que todos querem". E é uma pena: "A formação em enfermagem em Portugal é excelente". O problema é "não ser aproveitada".
Sim, Sílvia lamenta estar longe de casa, dos pais, da irmã e das três sobrinhas e não esconde que o Brexit assustou muitos enfermeiros, "que estão a regressar". Já Sílvia prefere "esperar para ver".
"Eles não podem mandar toda a gente embora e os meus patrões já se disponibilizaram para me ajudar no que eu precisar para ficar", diz, confiante, ela que está a fazer formação para ser diretora de lar.
Voltar não está nos planos, mas se fosse obrigada a nacionalizar-se, não olhava para trás: "Tenho orgulho em ser portuguesa. Nunca faria isso. Se tivesse que ir embora, ia".