Pai de menina de três anos protestou contra multa por estacionar em segunda fila e foi detido. Polícias julgados por abuso de poder e condutor por resistir.
Estava no carro à espera da mulher, com a filha de três anos a dormir no banco de trás. Multado por esperar em segunda fila, o condutor tirou o carro, mas protestou e até disse que ia falar com o comandante. Foi detido e, "à força", levado para a esquadra. Apesar dos apelos, foi impedido de levar consigo a menina, que ficou sozinha meia hora, fechada no carro. O caso aconteceu na tarde de 15 de outubro, em Custoias, durante a feira, e começou ontem a ser julgado no Tribunal de Matosinhos. Acusados de abuso de poder, são arguidos os agentes da PSP de Custoias Horácio Garcez - o polícia detido nos Açores, no início de setembro por, com outros elementos da claque do Boavista, ter agredido os funcionários de um restaurante - e Cipriano Reis. Também o condutor está a ser julgado, por resistência e coação.
Nesse dia à tarde, Pedro Sousa, 51 anos, do Porto, parou na feira, em segunda fila, enquanto a mulher corria a comprar legumes. Ele ficou ao volante porque no banco de trás dormia a filha, de três anos. Foi quando surgiu Horácio Garcez, que o mandou sair e o multou. Pedro parou mais à frente, mas protestou. E foi aí que a coisa descambou. Garcez disse, no inquérito, que foi empurrado e que, por isso, deu voz de detenção a Pedro, sendo obrigado a recorrer à força. Cipriano ajudou depois.
Versões contraditórias
O condutor conta outra versão. Diz que se virou para ir ao carro buscar os documentos e que foi agarrado pelo braço e detido, sendo ajudado por outro polícia. E que ambos se mostraram indiferentes aos seus pedidos para que não deixassem a menina sozinha. Na esquadra terá sido "espancado", posto de joelhos e algemado a um banco, durante "meia hora". "Implorei sempre a todos os que estavam na esquadra para me deixarem ir buscar a bebé mas ninguém teve coração", garantiu.
Como Garcez não compareceu ao julgamento - coube a Cipriano contar a versão da Polícia. Disse que correu a ajudar ao ver o colega ser empurrado. Quanto aos apelos para não deixar a criança no carro, afirmou que o condutor nunca falara do bebé. Disse que o "homem esteve sempre calmo", até na esquadra e que só o algemaram "para sua segurança".
Polícias desmentidos
Chamado a testemunhar, o fiscal da feira, que terá "assistido a tudo", começou por dizer que viu Pedro "empurrar" o polícia, para, logo a seguir, dizer que, afinal, não vira empurrão nenhum. Seguiu-se um casal que desmentiu o agente. Disseram que viram Pedro ser manietado e gritar, várias vezes, que tinha uma bebé no carro, que o deixassem levá-la pois não podia ficar só. E que, face à indiferença dos policias, o casal decidiu ficar junto à viatura, com outras pessoas, a velar pela criança.
A mulher, enfermeira, afirmou mesmo que face à demora, esteve "quase a chamar uma ambulância", porque achou que a bebé estava em perigo. E que não chamou a Polícia "porque eles sabiam que a criança estava no carro sozinha e não ligaram". O julgamento continua na quinta-feira.