Candidato de Esquerda à Presidência enfrenta desafio de deriva contra o PT e avanço do adversário de extrema-direita.
Quando, no domingo, os eleitores da coligação "O Povo Feliz de Novo" inscreverem, na urna eletrónica, o número 13, correspondente à lista Fernando Haddad, para presidente, e Manuela d"Ávila, para vice-presidente, estarão a votar em quem - no candidato do Partido dos Trabalhadores (PT) ou em Lula da Silva?
"Haddad é Lula", expressa a consigna da campanha. O ex-presidente está preso e o Tribunal Superior Eleitoral impediu a sua candidatura e é claro que, para os parceiros PT, Partido Comunista do Brasil (PC do B) e Partido Republicano da Ordem Social (PROS) e seus apoiantes, o candidato deveria ser mesmo Lula.
Por isso - lê-se na propaganda e ouve-se nos comícios -, "Haddad é Lula". Embora também seja certo que o catedrático de Teoria Política Contemporânea da Universidade de São Paulo não seja um substituto qualquer, nem candidato de mero recurso pronto a sacrificar numa disputa eleitoral radicalizada de forma inédita.
Tão inédita que rompe com a tradicional pugna entre direita, essencialmente agrupada em torno de forças de direita e centro-direita, e esquerda, geralmente encabeçada pelo PT, para entrar numa deriva "antipetista" que ameaça colocar grande parte dos eleitores no regaço da extrema-direita militarista e neoliberal comandada pelo ex-capitão Jair Bolsonaro.
"Trunfo" em S. Paulo
A última sondagem, da Datafolha, promete 32% a Bolsonaro e 21% a Haddad, prenunciando uma derrota na segunda volta entre os dois (dia 28), numa altura em que outros fatores se conjugam contra a campanha do "Povo Feliz". A inopinada "libertação" parcial de um acordo de delação com imputações graves a Lula é um deles.
Coordenador do "Programa de Governo" da candidatura ("chapa", no jargão eleitoral brasileiro), Fernando Haddad é, na realidade, o delfim de Lula da Silva, embora não pertencesse à corrente maioritária comandada pelo velho líder metalúrgico quando, em 2005, foi chamado para assumir o Ministério da Educação.
Foi Haddad o trunfo de Lula para conquistar, em 2012, a câmara municipal de S. Paulo, como rosto da nova geração do PT e pós-escândalo do "mensalão", ultrapassando nomes de peso no partido. Averbou 55% dos votos, apesar de ter partido com 3% nas sondagens. Mas foi o cordeiro sacrificial nas eleições de 2016 - vítima do abalo no PT com o escândalo da Lava Jato - derrotado na primeira volta.
Nascido em S. Paulo, em 25 de janeiro de 1963, numa família de imigrantes libaneses, Fernando Haddad é formado em Direito, mestre em Economia e doutor em Filosofia. Filiado no PT desde 1983, com apenas 20 anos e no tempo da ditadura militar (1964-85), era assessor no Ministério das Finanças quando, em 2005, a crise do "mensalão" levou de emergência Tarso Genro para a chefia do PT, deixando a pasta da Educação vaga.
O ministério tornou Haddad o "menino bonito" do presidente, ao traduzir um dos principais anseios de Lula: fazer com que jovens sem recursos pudessem aceder à Universidade, ao contrário dele. Só a bolsa de estudos ProUni levou às faculdades quase dois milhões de rapazes e raparigas. Deve-se-lhe também a expansão do ensino técnico: 400 escolas federais nos 27 estados brasileiros.
Na câmara de S. Paulo, a maior cidade do país, criou 96 500 vagas de educação infantil e programas de tratamento para toxicodependentes, reduziu a dívida em 62%, aumentou a mobilidade com centenas de quilómetros de corredores "bus" e ciclovias, entre outros programas. Até a imprensa internacional ("The Washington Post" e "The New York Times" incluídos) o elogiou.
Tópicos
Impostos para ricos
Haddad propõe-se criar um imposto sobre os bancos segundo as taxas de juro que cobrem, para obrigá-los a baixá-las, e taxar os grandes movimentos financeiros, os dividendos e as grandes fortunas. Mas isenta de impostos os rendimentos até cinco salários mínimos.
Reduzir homicídios
Para diminuir a violência, quer maior controlo das armas e munições, a criação de uma unidade especial de polícia contra o crime organizado e alternativas penais à prisão nos crimes sem conduta violenta. Quer a substituição da intervenção militar no Rio de Janeiro.
Programa social
Contra as privatizações, defende mais investimento público, a revogação da reforma laboral do Governo Temer, um plano de emergência para o emprego e o reforço dos programas sociais Bolsa Família e Minha Casa Minha Vida.
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