Avenida da Liberdade virou-se para o mercado residencial de luxo. Ruas próximas, como a Duque de Loulé, seguem a tendência
São três prédios que ficaram suspensos sobre estacas para escavar os 13 metros de profundidade que vão dar lugar a quatro pisos de estacionamento subterrâneo. Acima deles ficarão 97 apartamentos. O mais barato, um T1 com 71 metros quadrados e um lugar de garagem custa 405 mil euros. O mais caro é... ligeiramente mais caro: 1,7 milhões de euros é o preço de um T5 com 221 metros quadrados e quatro lugares de estacionamento.
Os preços são "de avenida", mas o novo empreendimento, um dos vários que estão a surgir na zona central da cidade, não fica na maior artéria da capital - o metro quadrado mais caro de Lisboa já se estendeu da Avenida da Liberdade às ruas adjacentes. No caso, trata-se das "Sottomayor Residências", na Duque de Loulé. Mas podia ser a Rua Alexandre Herculano, a Rosa Araújo ou a Rodrigues Sampaio.
Se o "renascimento" da Avenida da Liberdade foi lançado pelo comércio de luxo, é ponto assente que este está a trazer atrás o mercado residencial, também ele de luxo. "Se olharmos para a Avenida da Liberdade é notória a mudança", diz Patrícia Barão, responsável pela área residencial da consultora imobiliária JLL. Uma alteração que se começou a desenhar em 2014 com o edifício Ópera LX, no cruzamento da avenida com a Rua Rodrigues Sampaio, junto ao Teatro Tivoli. "Foi o tiro de partida para se começarem a desenvolver projetos do residencial", sublinha.
O Plano Estratégico de Lisboa para os próximos quatro anos identifica-a como uma nova micro-centralidade que se desenvolveu na capital - o eixo Marquês de Pombal/Av. da Liberdade criou uma identidade própria e, se começou por ter uma vocação quase exclusivamente comercial/de negócios, abriu entretanto as portas ao mercado residencial. É o metro quadrado mais caro de Lisboa: seis a nove mil euros. Nos últimos anos, aponta um relatório recente da JLL , os imóveis de habitação comercializados na avenida registaram "um valor médio de venda acima dos sete mil euros por metro quadrado". E deverá chegar aos dez mil euros, antecipa Patrícia Barão.
Nos últimos dois anos e meio foram colocados em comercialização 250 apartamentos na zona da Avenida da Liberdade. A "esmagadora maioria" foi vendida ainda em planta, "uma situação que tinha deixado de se verificar durante a crise", refere o estudo, que identifica as zonas de maior valor imobiliário da cidade (no conjunto nacional coloca a Av. da Liberdade apenas atrás do eixo Cascais/Estoril). Nos próximos dois anos devem chegar ao mercado mais 300 casas.
Um relatório de 2015 de uma outra consultora, a CBRE, conclui que a Avenida da Liberdade movimentou nos cinco anos anteriores um valor de 286 milhões de euros em transações de edifícios - que o relatório estima no número de 26. Boa parte do investimento (69%) é estrangeiro. Chineses, espanhóis, brasileiros e norte-americanos são as nacionalidades que mais têm investido na Avenida da Liberdade.
"Euforia imobiliária"
Os três edifícios mandados construir em 1904 pelo banqueiro Cândido Sottomayor como prédios de rendimentos (que hoje já não estão na família, evocando apenas o nome) dão hoje um bom retrato do perfil imobiliário da zona da avenida. Apesar de estar ainda numa fase inicial de construção já está ser vendido em planta e, garante um dos promotores do empreendimento, a bom ritmo. "A comercialização começou há três meses e estamos com 15 apartamentos vendidos. Acho que daqui a um ano teremos 80% vendido", diz Pico Durão, responsável de vendas da Fine& Country (que faz a comercialização do empreendimento, a par da JLL). Que tem uma explicação para o facto de os compradores já estarem a comprar muito antes da fase "chave na mão": "Vende-se em planta porque não há produto." O mesmo é dizer que a procura suplanta a oferta: "Há uma euforia imobiliária em Lisboa. Sente-se um aumento de preços brutal."
Mais portugueses a comprar
O que não havia antes e há agora são compradores portugueses. "Nos últimos quatro anos diria que quase 100% dos compradores no centro de Lisboa são estrangeiros", refere Pico Durão. Mas essa é uma realidade que está a mudar: "Temos portugueses a comprar neste empreendimento, o que não acontecia antes. Neste caso [das Residências Sottomayor] diria que 50% dos compradores são portugueses, 50% estrangeiros."
Patrícia Barão confirma a tendência - "Temos muitos clientes portugueses que estão a comprar nestas zonas". Quanto às motivações, são variadas: "Não podemos traçar um padrão. Há quem compre para passar umas temporadas, há investidores que compram apartamentos para colocar no mercado de arrendamento de curta-duração, ou mesmo no tradicional, de longa duração".
Recuperar traços de época
A abertura dos quatro pisos subterrâneos obrigou a uma obra de engenharia complexa, no caso das residências Sottomayor, mas não é por acaso que o promotor optou por esta via. O estacionamento. como a existência de espaços exteriores, são dois itens obrigatórios nas residências "prime". Neste capítulo o LX Lisboa - que recebeu o prémio SIL de reabilitação urbana - também parece ter dado o mote. com a manutenção da fachada original do edifício e reconstrução de elementos de época , uma tendência que se repete nos empreendimentos agora em construção.