O presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, usou, esta quarta-feira, o veto político pela 26.ª vez, devolvendo ao parlamento o decreto que despenaliza a morte medicamente assistida.
De acordo com a Constituição, a Assembleia da República pode confirmar o voto por maioria absoluta dos deputados em efetividade de funções, 116 em 230, e nesse caso o Presidente da República terá de promulgar o diploma no prazo de oito dias a contar da sua receção.
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O decreto hoje vetado foi o quarto aprovado no parlamento para despenalizar em certas situações a eutanásia ou o suicídio assistido.
O Presidente da República enviou para o Tribunal Constitucional o primeiro decreto sobre esta matéria, em fevereiro de 2021, vetou o segundo, em novembro do mesmo ano, e enviou o terceiro também para fiscalização preventiva, em janeiro deste ano. Os dois envios para o Tribunal Constitucional levaram a vetos por inconstitucionalidade.
Agora, perante a quarta versão, optou uma vez mais pelo veto político, prescindindo de exercer o direito de fiscalização preventiva, e pediu ao parlamento para "clarificar quem define a incapacidade física do doente para autoadministrar os fármacos letais, bem como quem deve assegurar a supervisão médica durante o ato de morte medicamente assistida".
Na carta hoje dirigida à Assembleia da República, Marcelo Rebelo de Sousa argumenta que "numa matéria desta sensibilidade e face ao brevíssimo debate parlamentar sobre as duas últimas alterações, afigura-se prudente que toda a dilucidação conceptual seja acautelada, até pelo passo dado e o seu caráter largamente original no direito comparado".
Professor catedrático de direito, eleito nas presidenciais de 24 de janeiro de 2016, Marcelo Rebelo de Sousa definiu-se um ano após a eleição como um Presidente que não recorre ao Tribunal Constitucional como "uma espécie de defesa", mas que exerce "sem complexo nenhum" o veto político, perante fortes divergências.
Utilizou 26 vezes o poder de veto político: três vezes em 2016, duas em 2017, seis em 2018, cinco em 2019, seis em 2020, três em 2021 e uma em 2023. Quatro destes vetos incidiram sobre decretos do Governo e 22 sobre legislação da Assembleia da República.
Demorou quase três anos e meio a enviar um diploma para o Tribunal Constitucional e submeteu até agora, no total, seis decretos para fiscalização preventiva que resultaram em quatro vetos por inconstitucionalidade.
O último pedido ao TC foi em janeiro deste ano, sobre as associações públicas profissionais mas acabaria por promulgar o decreto da Assembleia da República, porque o Tribunal Constitucional se pronunciou favoravelmente ao diploma.
Em março de 2021, a propósito de uma polémica sobre a chamada lei-travão, Marcelo Rebelo de Sousa expôs os seus critérios de decisão em matéria de promulgação e veto numa mensagem escrita, explicando que utiliza o que apelidou de "veto corretivo".
Segundo o chefe de Estado, perante dúvidas de constitucionalidade, procura "uma interpretação dos diplomas que seja conforme à Constituição" e quando isso é possível tem optado pela promulgação.
"Quando é impossível essa interpretação e a iniciativa parlamentar merece acolhimento substancial, tem recorrido a uso de veto corretivo, convidando a Assembleia da República a aproveitar a sua iniciativa, tornando-a conforme à Constituição", afirmou.
O chefe de Estado acrescentou que, "em caso de convicção jurídica clara, de se encontrar perante uma inconstitucionalidade e nenhuma justificação substancial legitimar o uso de veto, se reserva o recurso ao Tribunal Constitucional".