O Presidente da República enviou, esta quarta-feira, para o Tribunal Constitucional para fiscalização preventiva o decreto do parlamento que altera o regime jurídico das associações públicas profissionais.
Segundo uma nota publicada no sítio oficial da Presidência da República na Internet, o chefe de Estado "considera que o decreto da Assembleia da República suscita dúvidas relativamente ao respeito de princípios como os da igualdade e da proporcionalidade, da garantia de exercício de certos direitos, da autorregulação e democraticidade das associações profissionais, todos previstos na Constituição da República Portuguesa".
"Tendo em atenção a certeza e a segurança jurídicas, o Presidente da República decidiu submeter a fiscalização preventiva de constitucionalidade pelo Tribunal Constitucional, o decreto da Assembleia da República que altera a legislação relativa às associações profissionais e o acesso a certas profissões reguladas", lê-se na nota.
Marcelo Rebelo de Sousa anunciou na terça-feira, e confirmou hoje, a intenção de enviar este decreto para o Tribunal Constitucional, "para que haja certeza e segurança" jurídicas.
Este decreto foi aprovado em votação final global em 22 de dezembro, com favoráveis de PS, Iniciativa Liberal e PAN, votos contra de PSD, Chega e PCP e abstenções de BE e Livre.
Após fixação da redação final, seguiu para o Palácio de Belém na sexta-feira, 27 de janeiro, de acordo com o portal da Assembleia da República.
O texto final do decreto, apresentado pela Comissão de Trabalho, Segurança Social e Inclusão, teve origem em projetos de lei do PS e do PAN.
Na carta enviada ao Tribunal Constitucional, o Presidente da República pede a apreciação de normas sobre avaliação dos estágios, composição de órgãos disciplinares, incompatibilidades entre o exercício de funções nos órgãos de associações públicas profissionais e o exercício de funções dirigentes na função pública, provedores dos destinatários de serviços e órgãos de supervisão.
Marcelo Rebelo de Sousa refere que "as associações profissionais são consideradas associações públicas, gozando de um estatuto" assente em normas da Constituição como o número 1 do artigo 47.º, segundo o qual "todos têm o direito de escolher livremente a profissão ou o género de trabalho, salvas as restrições legais impostas pelo interesse coletivo ou inerentes à sua própria capacidade".
O chefe de Estado cita também o número 4 do artigo 267.º da Constituição, que determina que "as associações públicas só podem ser constituídas para a satisfação de necessidades específicas, não podem exercer funções próprias das associações sindicais e têm organização interna baseada no respeito dos direitos dos seus membros e na formação democrática dos seus órgãos".
De acordo o Presidente da República, "as normas agora sindicadas estabelecem um conjunto de restrições relevantes ao princípio da autorregulação das associações profissionais e à demais proteção constitucional destas entidades" que resulta dos artigos citados.
No seu entender, "é o que sucede com a conjugação da competência com a composição do conselho de supervisão".
"Ao assumir funções que são de verdadeira autorregulação genérica -- envolvendo o controlo da legalidade no exercício dessa regulação -- tendo titulares que, na sua maioria, não pertencem â respetiva associação profissional, e não são democraticamente eleitos pelos associados da mesma, as normas que definem tal composição parecem enfermar de inconstitucionalidade, por violação do referido principio e correspondentes normas constitucionais", sustenta.
Marcelo Rebelo de Sousa defende que o mesmo se aplica à "atribuição de funções de natureza disciplinar, de avaliação de final de estágio ou da atribuição da função de provedor a não inscritos na associação profissional, assim violando o principio da autorregulação".
Em matéria de incompatibilidades, segundo o Presidente da República, "cria-se uma restrição desproporcionada " e "sem evidência de fundamento material".
"Tal significa, por exemplo, que o diretor do serviço de um hospital público do Serviço Nacional de Saúde está impedido de exercer funções nos órgãos diretivos da Ordem dos Médicos, da qual é obrigatoriamente membro, enquanto o diretor de serviço idêntico de um hospital privado não está sujeito à mesma incompatibilidade, o que pode violar o principio da igualdade na dimensão de igualdade proporcional", aponta.
Com esta base, o Presidente da República pede a fiscalização de um conjunto de normas deste decreto, "por violação dos princípios da igualdade e proporcionalidade, previstos nos artigos 13.º e 18.º, da garantia de exercício de direitos políticos, prevista nos artigos 50.º e 269.º, do princípio da autorregulação das Ordens Profissionais, dos artigos 47°, n.º 1 e 267.º, n.º 4, , todos da Constituição da Republica Portuguesa".
Este é o sexto pedido de fiscalização preventiva da constitucionalidade que Marcelo Rebelo de Sousa dirige ao Tribunal Constitucional desde que assumiu a chefia do Estado, em março de 2016.