Portugal tem barragens construídas em todos os rios de média e grande dimensão do país, o que é prejudicial para o ambiente mas também para os seres humanos, disseram esta quarta-feira organizações ambientalistas.
Segundo uma investigação publicada pela revista científica Nature, grande parte dos maiores rios do mundo tem barragens e albufeiras, com apenas um terço a correr ainda de forma livre.
A conclusão resultou da primeira avaliação global da localização e extensão dos rios que correm livremente, que sublinha a grande degradação observada e alerta para a redução drástica dos benefícios dos rios saudáveis, para as pessoas e para a natureza.
Se no mundo 63% dos maiores rios tem barragens, em Portugal a percentagem é 100%, salientou o presidente da associação ambientalista Zero, Francisco Ferreira.
"A questão é extremamente importante, rios com expressão significativa em termos de caudal e comprimento já não temos nenhum livre", disse o responsável à Lusa, adiantando que tal compromete também a componente recreativa e natural dos rios.
Afonso do Ó, consultor científico para a água da Associação Natureza Portugal (ANP), representante da internacional World Wildlife Fund (WWF, Fundo Mundial para a Natureza), disse à Lusa que em Portugal há "claramente barragens a mais" e que o país é dos que tem mais barragens do mundo.
"Não temos nenhum rio grande sem barragens ou barreiras - apenas pequenos afluentes que correm livres, e todos eles desaguam em rios fragmentados. Isto significa que todos os serviços do ecossistema em Portugal que é suposto um rio livre fornecer, deixámos de ter, e com isto já vimos extinguir várias espécies", alertou o especialista.
Francisco Ferreira não negou a importância das barragens, mas alertou para os obstáculos que representam ao impedir os sedimentos de fluir para o mar e ao impedir as espécies migratórias de subirem os rios. "Tudo isto tem valências importantes na economia", disse.
Afonso do Ó notou ainda que em Portugal há um número indeterminado de barreiras que causam fragmentação dos rios e que muitas delas podem até já ser desnecessárias, sendo preciso identificá-las, perceber quais os custos-benefícios e possivelmente removê-las para permitir a "renaturalização dos rios que já não precisam de estar fragmentados".
De acordo com o trabalho hoje publicado, que juntou uma equipa de 34 investigadores, alguns da WWF, há no mundo mais de 60.000 grandes barragens (paredes maiores do que 15 metros) e estão em construção ou planeadas mais 3.700 barragens hidroelétricas.
Embora a energia hidroelétrica tenha inevitavelmente um papel no cenário das energias renováveis, os países devem considerar opções "como o vento e o sol, que bem planeados podem ter menos impactos prejudiciais nos rios, nas comunidades, nas cidades e na biodiversidade", disse Michele Thieme, cientista da WWF.