Vão atrás da cerveja a 50 cêntimos, dos giros e das giras ou do convívio ao fim da tarde. São mais universitários, mas há também adolescentes. Câmara estuda redesenho da zona
Cinco da tarde, a clássica hora do chá em Inglaterra, é em Lisboa a hora da cerveja no renovado Jardim do Arco do Cego. Com os dias já mais soalheiros, os grupos juntam-se na relva às dezenas, uns de copo de plástico na mão, outros a jogar raquetas ou apenas a ver se há giros ou giras no horizonte. São estudantes universitários, na maioria, mas há também, e cada vez mais, miúdos do secundário e até algumas famílias com as crianças ou a passear os cães.
Na fronteira com Avenida Duque de Ávila, o jardim, mesmo no centro da cidade e inaugurado em 2005 num local onde antes era um terminal para elétricos e depois para autocarros, mudou o bairro e deu-lhe outra vida. Onde antes havia carros e filas, agora há passeios largos, novos restaurantes, alguns de chef, cafés ou pastelarias. E habitantes que aproveitam a via pedonal/ciclável que liga o Arco do Cego a Monsanto.
A Câmara de Lisboa está a estudar alterações ao Jardim do Arco do Cego - ou apenas o Arco, como muitos já se referem ao local em contraponto com o Bairro, de Bairro Alto -, nomeadamente o redesenho do espaço e até a introdução de novos equipamentos, como sanitários públicos. "Um dos aspetos que ficaram presentes desde o início era que teria de ser redesenhado o espaço público, de forma a encontrar um espaço de convívio onde quem frequenta durante o dia estes estabelecimentos pudesse permanecer de forma menos conflituosa com os moradores", afirmou à Lusa o vice-presidente da câmara, Duarte Cordeiro. A convivência com os moradores não tem sido pacífica, as queixas contra o lixo, o tráfico de droga, as garrafas partidas e o barulho têm chegado à autarquia.
O Quiosque do Bairro é um dos vários cafés em redor onde os jovens se vão abastecer de cerveja a 50 cêntimos o copo. Tem esplanada até às 02.00. O gerente Hugo Álvares conta como há um ano foi pedir o licenciamento para um evento noturno e ouviu que "já havia 250 queixas de moradores por tráfico de droga, lixo e etc., e que eu devia era reduzir o horário para melhorar o ambiente". Garante que não tem que ver com as horas mas com a ida para o local de grupos mais duvidosos que só a polícia poderia controlar. Miúdos adolescentes a enrolar cigarros de haxixe e a falar alto. Parecem saídos de um videoclip de uma banda de rap americano: as miúdas de calções curtos e os rapazes com óculos escuros e os bonés do avesso na cabeça. "Eu vendo a cerveja a 50 cêntimos ao balcão e a 75 na esplanada. Mas a partir das 21.00 já aumento para um euro e 1,75 euros", conta Nuno que organiza festas ou eventos com música que fazem do espaço "um novo Bairro Alto".
Para ser perfeito só falta música
Há de tudo nesta espécie de novo Bairro. Há até quem nem estude em Lisboa mas venha de propósito ter com as amigas ao Jardim do Arco do Cego. Assim acontece com Vanessa, 22 anos, e Mariana, 23, estudantes de Fisioterapia em Alcoitão e de Engenharia Geológica na Faculdade de Ciências e Tecnologia da Costa de Caparica (Almada). Encontrámo-las sentadas na relva, de copos de plástico na mão e bolachas de arroz integral à vista.
Muito urbanas, com as duas amigas de nome Margarida, uma de 22 e outra de 23 anos, universitárias de Lisboa, uma do ISEL e outra do Instituto Superior Técnico (vizinho do jardim), futuras engenheiras de eletrotecnia. "Gosto muito de vir para aqui, ao pé da FCT na Costa não se passa nada", diz Mariana, entre risos. "Temos bom ambiente e cerveja barata. Para estar perfeito só falta uma musiquinha", acrescenta Vanessa. Sobre as queixas que os moradores da zona têm feito, do lixo acumulado, das ganzas , das garrafas partidas e do barulho, concordam apenas com um aspeto: "A acumulação do lixo é um problema." "Ah! E falta um WC público."
Vestido com o traje universitário completo, Francisco Garcês, estudante do 2.º ano de Gestão de Marketing no ISCTE, joga raquetas com um amigo no coração do jardim enquanto equilibra, na outra mão, um copo de cerveja.
Lisboeta, Francisco mora em Alvalade, estudou nas escolas da zona e há anos que frequenta o jardim com "os pais e os tios". Notou mudanças no espaço. "Vem pessoal bastante mais jovem, até com 14 e 15 anos." Para Francisco "o problema maior é o lixo que se acumula". Nunca notou que o consumo de drogas fosse muito evidente. Para ele e muitos outros é apenas um lugar para descontrair.