Esquerda pede respeito pelos contribuintes. Direita defende privados. Dinheiro não é para usar "no redundante", diz o ministro
O financiamento público do ensino particular e cooperativo voltou hoje a dividir o parlamento, com PSD e CDS a defenderem a sobrevivência destas instituições e PS, BE e PCP e PEV o respeito pelo dinheiro dos contribuintes.
A pedido do PSD, o ministro da Educação, Tiago Brandão Rodrigues, esteve hoje na Assembleia da República para um debate sobre os contratos do ensino particular e cooperativo, que têm estado envoltos em polémica devido à decisão do executivo de os rever tendo em conta a existência ou não de oferta pública.
No debate, os partidos de esquerda defenderam que "é preciso racionalizar os meios" (PEV), que o financiamento destes colégios "é um abuso sobre os impostos dos contribuintes" (Bloco de Esquerda) e que "viola a lei" em vigor (PCP).
A deputada Ana Virgínia Pereira (PCP), acusou o anterior governo de "violar a lei ao desviar alunos das escolas públicas para privadas" e Heloísa Apolónia (PEV) sublinhou que ninguém iria retirar "abruptamente os meninos das escolas", uma vez que a questão se prende apenas com a abertura de novas turmas.
Já para os deputados do PSD e CDS, trata-se de uma questão de liberdade de escolha e, acima de tudo, de garantir que as promessas são cumpridas, ou seja, de que "o Governo honra a sua palavra".
O anterior Governo "assinou um contrato plurianual que permitiu uma redução do valor por turma, mas que possibilitou uma maior estabilidade e previsibilidade a estas escolas que lhes permitisse ajustarem a sua oferta", defendeu o deputado do PSD Amadeu Albergaria.
Para o PSD, o Ministério da Educação, o Bloco de Esquerda, o PCP e os Verdes "estão a colocar em causa a sobrevivência destes estabelecimentos, estão a colocar em causa milhares de postos de trabalho de professores, estão a colocar em causa milhares de postos de trabalho de funcionários, estão a colocar em causa a transição de ciclo de milhares de alunos no percurso escolar e a frustrarem as legitimas expetativas das famílias", afirmou Amadeu Albergaria.
No debate, PSD voltou a garantir que não está contra a escola pública e o Governo a reafirmar que "nada os move" contra a escola privada.
"Não aceitamos que nos digam que estamos contra a escola pública do Estado", afirmou Amadeu Albergaria, que considera que as medidas da atual equipa governativa revelam um "profundo preconceito ideológico".
Em resposta, o ministro da Educação resumiu a posição da esquerda sobre a matéria: "Nada nos move contra os agentes privados de educação", disse Tiago Brandão, lembrando os apoios financeiros estatais atribuídos a instituições privadas de ensino pré-escolar ou ao ensino artístico.
O ministro voltou a garantir que os contratos celebrados pelo anterior executivo seriam cumpridos, mas que é preciso respeitar o dinheiro dos contribuintes: "O respeito pelo Orçamento do Estado exige-nos que usemos no necessário e não no redundante, não duplicando a fatura paga pelo contribuinte. Exige-nos que validemos os contactos cujas condições acordadas se efetivam e cujo fim a que se destinam são alcançados".
Tiago Brandão Rodrigues lembrou que estes contratos de associação foram celebrados há duas décadas, quando ainda existiam zonas do país sem escolas públicas suficientes para todos os alunos. Era preciso "assegurar transitoriamente uma rede escolar pública o mais alargada possível" e, por isso, o Estado contratualizou com entidades privadas.
No entanto, começou a haver sobreposição de oferta e transferência de alunos das escolas públicas para as privadas, que continuavam a ser financiadas pelo Estado. Neste momento, o Ministério da Educação paga 80.500 euros por ano por cada turma.
Em janeiro, o ministério anunciou que ia analisar a rede para garantir que não havia duplicação de oferta e, entretanto, disse que só seriam financiadas novas turmas nas zonas sem oferta pública.
Em relação aos apoios já atribuídos, o ministério garantiu que mantinham as verbas às turmas até que estas terminassem o ciclo em causa. Depois, depende da existência de oferta pública.
Para Joana Mortágua, do BE, estas decisões "não deveria ter impacto nenhum", tendo em conta a atual legislação: "A não ser que os colégios tenham andado a desviar alunos, esta medida não deveria ter impacto nenhum".
Já Nilza de Sousa, do PSD, sublinhou os acordos e promessas anteriormente feitas: "o que está em causa é o bom nome do Estado (...) é a violação do princípio da confiança".
A deputada do CDS-PP, Ana Rita Bessa, questionou a legalidade de acabar com os concursos de atribuição de verbas: "A decisão do número de turmas a abrir nestas escolas volta a ser tomada na opacidade dos gabinetes em vez de ser através de concursos públicos transparentes como era no anterior governo".
Amadeu Albergaria sugeriu ao executivo uma visita às escolas na esperança de que "talvez o radicalismo se modere e se evite mais um erro".