Promessas de amizade eterna e disponibilidade para ajudar, marcam segundo dia da visita de Estado do Presidente a Maputo
A visita de Estado a Moçambique entra hoje na sua dimensão mais política. Marcelo Rebelo de Sousa encontra-se pela primeira vez com o Presidente Filipe Nyusi - haverá mais dois momentos em que ambos os chefes de Estado estarão sentados à mesma mesa -, tendo em pano de fundo a crise financeira que atinge a economia moçambicana e a crescente tensão político-militar entre os velhos rivais Frelimo, Renamo. É neste contexto, mas sem as anunciadas manifestações e protestos no centro de Maputo, que o Presidente português se tem mostrado particularmente cauteloso nas declarações públicas que faz sobre o ambiente político em Moçambique.
E mesmo quando acede a pronunciar-se - foi a terceira vez que foi interrogado sobre o assunto desde que chegou - Marcelo não evita a prudência e mede todas as palavras que diz. "Eu acompanho Moçambique há muitas décadas, e estive aqui muitas vezes depois da independência a dar aulas e a fazer exames, e vivi períodos muito difíceis da vida de Moçambique. E uma coisa que reconheço é que Moçambique soube sempre dar a volta à situação. Mesmo nos momentos de maior dificuldade e de maior pobreza, soube reagir e dar a volta. Já viveu momentos piores do que este, bastante piores. E vai dar a volta à situação". É esta palavra de confiança que o Presidente da República, sem escamotear o momento difícil que se vive neste país, quer transmitir aos moçambicanos.
Sobre a hipótese de Portugal vir a ter um papel de mediação no conflito que opõe as duas principais forças políticas moçambicanas, Marcelo Rebelo de Sousa opta, mais uma vez pela prudência. "Não vamos pôr o carro à frente dos bois", diz o Presidente da República recorrendo a uma expressão popular portuguesa. "É nos momentos difíceis que se veem os amigos. E este é um momento difícil. E o papel que Portugal pode ter nesta altura é não desistir de Moçambique". Daí que, apesar das dificuldades no plano económico internacional, Marcelo não se canse de apelar à continuação do investimento português em Moçambique, "é fundamental, é para continuar e é para aumentar", porque este é um "país de futuro". Não é pois inocente que da agenda presidencial constem visitas a "bons exemplos" de aplicação de dinheiro português da cooperação entre os dois países, que deve ser mantida "a todos os níveis". Foi o caso do Centro de Formação Profissional de Metalomecânica de Maputo que existe há 15 anos, e que resulta de uma parceria entre o IFP e a UGT com sindicatos, empresas e organismos públicos moçambicanos. Mas também no domínio da Educação, da Cultura ou da esfera militar. Ao mesmo tempo, Marcelo enaltece todos aqueles investidores portugueses que, apesar da incerteza - uma constante dos dias de hoje -, resistem e continuam a apostar em Moçambique com novos projetos empresariais. Mesmo assim, a comunidade portuguesa em Moçambique tem vindo a diminuir.
Afetos e pontes de diálogo
Marcelo Rebelo de Sousa sabe que, por mais que quisesse, não pode exportar para Moçambique aquilo que é o modelo da sua presidência em Portugal. Se os afetos nunca são demais, coisa diferente é assumir-se ou voluntariar-se para a mediação e construção de pontes entre forças políticas desavindas. "Não podemos falar em questões que dizem respeito à soberania de um Estado. Para nós há coisas que são mais ou menos evidentes. Moçambique é um Estado soberano, é um Estado que forma uma unidade que não é cindível e que não é partível, e também é evidente que num Estado soberano, como nós achamos em relação a Portugal, quem tem a palavra decisiva é o poder político".
Ou seja e descodificando, a palavra decisiva caberá sempre à Frelimo que exerce o poder desde a independência de Moçambique. Durante o dia de ontem, fontes diplomáticas chamavam a atenção para o facto de ser mais fácil a um partido de oposição apelar à intervenção de um mediador do que a um partido de governo que tem a tarefa de gestão dos assuntos de Estado. Seja como for, Marcelo disse-o por mais do que uma vez, "os moçambicanos sabem que têm aqui um grande amigo e que faz tudo o que é fundamental, como os amigos fazem, para Moçambique seja uma verdadeira potência económica, social, cultural e política".
E é isso que o Presidente da República dirá nos encontros com o seu homólogo Filipe Nyusi, mas também nas reuniões agendadas fora da agenda oficial do programa com os partidos parlamentares, Frelimo, Renamo e Movimento Democrático de Moçambique. Dos resultados destas conversas pouco transpirará até porque, de acordo com fontes diplomáticas, para que o objetivo de pacificação seja alcançado com eficácia há que haver discrição nas iniciativas que se promovem. Mas será no histórico Hotel Polana de Maputo que Marcelo Rebelo de Sousa medirá o pulso às diversas sensibilidades políticas moçambicanas relativamente à possibilidade de Portugal ter um papel mais ativo neste processo. Mas isso só acontecerá a pedido e, mesmo assim teria que haver uma avaliação por parte de Portugal sobre se valeria a pena apostar nesta mediação.