Entrevista a Francisco George, Diretor-geral de Saúde
Detesta que lhe tirem fotografias e recusa-se a olhar de frente para a câmara. "Não faço pose, ponto final." Trabalhou com os ministros dos sucessivos governos. De uns já era amigo, com outros construiu uma cumplicidade que se prolonga no tempo. O apelido inglês veio do avô, quadro da Carris que se casou com uma portuguesa, e essa história pode ser lida no site onde Francisco George escreve quando tem tempo, a par de lições profissionais. Está permanentemente atualizado sobre o que se passa no mundo da saúde mundial e passa as férias no "parque natural da Alameda", o oitavo andar onde tem o gabinete. Na família cruzam-se o rigor e a criatividade da ciência com a arte. Teve três filhos com uma arquiteta discípula do tio Frederico George, o homem do ateliê que formou gerações de arquitetos e artistas plásticos. Há dez anos, Maria João e uma filha morreram num acidente de automóvel. Como é que se sobrevive a uma perda tão devastadora? "Com luta, com luta, com luta."
A sua opção pela saúde pública foi tomada por influência de Arnaldo Sampaio, o pai de Jorge e Daniel Sampaio?
Foi por influência dele e por oposição ao meu pai, Carlos George. Eu era interno do meu pai, então diretor do Hospital de Santa Marta, e percebi que tinha de ir para uma especialidade diametralmente oposta à dele, a Medicina Interna. Não gostava de ser o filho do diretor. Um dia disse-lhe: "A minha vocação é a epidemiologia, a saúde pública, vou falar com o nosso amigo Arnaldo Sampaio." Era nosso amigo de sempre e éramos vizinhos, não só em Campo de Ourique como na Praia das Maçãs. E então combinei com o Arnaldo Sampaio, nesta mesa...
Nesta mesa?
Nesta mesa. Era este o gabinete do Arnaldo Sampaio. Foi ele que transferiu a Direção-Geral da Saúde da Praça do Comércio aqui para a Alameda [D. Afonso Henriques]. Combinei com ele mudar de carreira.
A Medicina Interna e a Saúde Pública são especialidades que não se confinam a uma única área.
Sim, ambas são abrangentes, têm um olhar mais vasto. Há especialidades que se ocupam só de um órgão, ou apenas de um aspeto desse órgão, uma superespecialização. A minha visão, como médico, tem um horizonte mais longínquo.
Há história de epidemias desde a Bíblia, são fenómenos de sempre.
Muito antes da Bíblia, mesmo. Na descrição da Guerra do Peloponeso há uns capítulos de Tucídides sobre uma epidemia em Atenas e os historiadores estão convencidos de que terá sido gripe. Sem medicamentos para a febre, as pessoas sofreram muito e as descrições são impressionantes. Ao longo da história do homem, há confrontos com fenómenos impostos pela natureza e que sabemos que têm agentes vivos na origem. Bactérias, como a peste, como a tuberculose ou a cólera, vírus, como a gripe ou a febre-amarela, que foi um problema em toda a Europa, incluindo em Portugal. O paludismo, provocado por um parasita, é conhecido desde sempre. O conhecimento sobre estes fenómenos é muito recente. A primeira bactéria causadora de uma doença foi identificada em 1860. Em 1933, o vírus da gripe foi identificado mas não foi visualizado: as partículas eram tão pequenas que atravessavam os poros de uma porcelana. Só muito depois se conseguiu vê-lo com meios eletrónicos, e agora moleculares, e então estudá-lo. Hoje conhecemos a composição do vírus da gripe, quer no que se refere à morfologia quer às mudanças, porque está sempre a mudar. Só na segunda metade do século XX foi possível medi-lo: tem um diâmetro de 100 nm (nanómetros), o que significa que é 10 mil vezes mais pequeno do que o milímetro.
É um dos mais pequenos?
Sim, mas o vírus zika tem metade do tamanho do vírus da gripe, é 20 mil vezes mais pequeno do que o milímetro.
Mas continua a ser um problema todos os anos. Porquê?
A gripe nunca poderá ser eliminada nem erradicada porque tem como reservatório as aves, sobretudo as aquáticas silvestres, os patos selvagens. E as aves migratórias são imensas. A especial atenção que dou à virologia e que me tem sempre atraído começou em 1980, na altura em que a sida emergiu sem se saber o que era.
Qual é a relação?
Em 1980, não estávamos preparados para admitir a possibilidade de aparecer uma doença nova com expressão epidémica e pandémica. Não se estudava a hipótese de surgir um problema novo.
Foi preciso partir de uma base zero?
Exatamente. Sou médico desde 1973 e então pensava-se que a medicina podia controlar todos os problemas. Tratava as infeções, as doenças crónicas, erradicava doenças. A sida emergiu em 1980, ano em que comecei o meu trabalho na Organização Mundial da Saúde [OMS]. Dediquei-me, fiz parte dos trabalhos iniciais, para ver o que estava a acontecer. Foram precisos três anos para Luc Montagnier, do Instituto Pasteur, identificar o vírus que invadia as células que têm a responsabilidade da proteção do organismo. Ataca as células que formam os anticorpos. Era a mesma coisa que um grupo de bandidos organizar a invasão de esquadras da polícia. Desde o alerta até à descoberta passaram três anos. Hoje isso não aconteceria.
Porquê?
Porque os laboratórios e os centros de investigação científica trabalham em rede, os meios telemáticos, baseados nas plataformas de trabalho da internet, permitem a produção de conhecimento muito mais rápida. Isto era impensável. Há um trabalho constante, diário, de aprofundar conhecimentos e ir mais longe, objetivar todos os problemas que não compreendíamos e isso representa uma fonte de atração ímpar. Olhando para os meus colegas que estudaram comigo, penso muitas vezes que se eles se notabilizaram em determinadas áreas - e, com certeza, dá satisfação um cirurgião transplantar fígados - eu gosto desta outra medicina de procurar onde o problema pode ser resolvido. Perceber como surge uma doença, o que está na sua origem e, depois, no seu ciclo ou na sua história natural, ver qual é o ponto onde pode ser atacada. Na perspetiva da saúde pública, a epidemiologia é encontrar uma solução para resolver um problema onde ele é vulnerável.
Como numa situação de guerra?
Exato. Tem meios, linhas de comando, especialistas que colaboram uns com os outros. E é baseado em métodos científicos, aplicados à distribuição destes fenómenos. Isso é válido para as doenças de natureza infecciosa e para outras, nomeadamente as crónicas. Hoje dizemos que a curva ascendente dos casos novos de diabetes está descontrolada, tem uma expressão epidémica - e é uma doença crónica, não é infecciosa.
Tem de dedicar grande parte do tempo a estudar, a atualizar-se?
Todos os dias, é essencial. Quem é que em novembro falava de zika? Ninguém. Foi descoberto em macacos em 1947, na floresta Zika. Circulou em animais, dez anos depois deu origem a pequenos surtos...
Já com pessoas?
Sim, em África. Mais tarde, apareceu na Polinésia Francesa, ainda sem grandes problemas. Foi durante o Campeonato do Mundo de Futebol, no Brasil, há dois anos, que reemergiu e percebemos: "Aqui começa um problema." E agora tem a expressão que todos conhecem. É preciso saber como é o vírus, quais são as suas características, perceber como surge, como é transmitido, qual o período de incubação. Os epidemiologistas conduzem estes estudos e, depois, apontam soluções para reduzir os problemas e controlá-los. Não há medicamentos antivirais eficazes para este vírus, por isso vamos estudar a sua história natural, o seu ciclo, e ver onde é mais vulnerável. E uma vez que também não há vacina e os inseticidas representam problemas, temos de ir à fase das larvas, evitar acumulações de água, para as fêmeas dos mosquitos não terem lugar para pôr ovos.
É uma situação idêntica ao paludismo?
O paludismo é diferente. No caso do zika, o mosquito põe os ovos em coleções de água que podem ser muito pequenas, em meio urbano: uma lata de sardinhas, um pneu deixado ao ar livre. Mas o paludismo tem um tratamento eficaz e, portanto, usa-se, preferencialmente, o tratamento dos doentes, acompanhado pela luta antivetorial.
Penso que todos sabemos que quando há um problema nos traz uma informação clara...
Informação fundamentada e consistente. Tem de acontecer assim. Sem estar a criticar os meus antecessores, penso que o combate à sida, em Portugal, pode não ter sido bem conduzido no início. As epidemias não se resolvem às escondidas. E é sempre possível falar para as pessoas perceberem. Eu que sou médico e especialista, que até percebo e conheço os métodos de biologia molecular, uma vez ouvi uma entrevista a um colega meu de genética e não percebi. As pessoas não podem falar para elas próprias, têm de falar para os cidadãos. Temos uma atenção especial à comunicação. Não é uma comunicação ligada à política. O diretor-geral, os subdiretores, os diretores de serviço, os diretores dos programas, são convidados a não trazer política para a saúde pública. A nossa comunicação não pode ser utilizada para outros fins, tem de ser baseada nos princípios da transparência, da rapidez, da consistência e da clareza. Tem de ser percetível.
Na carreira da saúde pública, podia ter ido para a investigação e optou por ser delegado de saúde. Porquê?
Sim, o meu trabalho é mais operacional, é a minha vocação. Trabalhei muito no mato. Aprendi muito com Francisco Cambournac, no campo.
Na Guiné-Bissau?
Sobretudo na Guiné-Bissau. Estive em praticamente todos os países africanos onde, depois, trabalhei em sida - em todos eles, sobretudo Zimbabué, Madagáscar, Zâmbia. Tem de haver alguém na linha da frente, não é? Tem de haver aqueles que vão investigar um problema que surge aqui ou ali, numa cidade ou no interior, e perceber o que se está a passar. Chamamos a isso epidemiologia operacional.
Isso deu-lhe o contacto com os doentes e com as condições em que viviam?
Exatamente. E estava associado a uma fonte de conhecimentos sem fronteiras. Na Organização Mundial de Saúde, recebíamos todas as semanas uma mala - a chamada valise - que vinha de avião com documentação e informações de carácter científico. Na altura não havia os meios de hoje, não havia, sequer, telefones...
Hoje a valise chega por e-mail?
Ainda existe, sobretudo com outros fins. Vinha com as informações, para sabermos o que estava a acontecer e tomarmos as medidas de uma forma coordenada. Lembro-me de um trabalho magnífico, logo no princípio, estava a trabalhar para Brazzaville: perceber como a sida se transmitia. Ninguém sabia a origem, se eram os mosquitos que a transmitiam, qual era o agente. Tínhamos um critério clínico que definia uma síndrome... Era preciso perceber se, junto aos grandes lagos, sobretudo do Burundi e do Ruanda, onde a densidade populacional de mosquitos é maior, o aparecimento da síndrome era mais frequente. Viu-se que os mosquitos não transmitiam este agente, que na altura não sabíamos que era um vírus. Foi a primeira festa que se fez, com esta descoberta...
Como é que se faz uma festa nessas circunstâncias?
É jantar melhor, com mais tempo, dançar, rir, contar histórias, beber cerveja: "Os mosquitos não transmitem!" São conquistas. Neste caso era decisivo: se o mosquito transmitisse, a doença era inevitável.
A investigação é infinita?
A investigação de problemas que afetem a saúde dos homens, das comunidades e das famílias é imparável. Por exemplo, ainda hoje se discute se o vírus é uma partícula viva ou se é inerte. Ele não se multiplica; ele entra numa célula do nosso organismo e diz ao ácido nucleico: "Faz-me iguais! Replica-me." As células que ele invade não morrem, fazem "fotocópias", partículas iguais.
Ao longo da sua vida, houve uma evolução gigantesca neste campo.
Daí a minha atração, se quiser. Não é por acaso que está ali a fotografia de Wilson Smith, que descobriu o vírus da gripe. Temos aqui uma equipa que trabalha a tempo inteiro nestas questões. Estamos sempre em contacto com os nossos colegas europeus e da OMS, fazemos audioconferências e videoconferências diárias a toda a hora, reproduzimos os resumos e mandamos para uma rede que inclui Açores, Madeira e os principais virologistas do país.
Não é só burocracia, a Direção-Geral?
Tenho problemas com a administração, quando levantam a questão dos papéis... Tem de haver alguém que trate dos papéis, mas também tem de haver alguém que diga não aos papéis.
Porque não pode haver atrasos?
Não pode haver atrasos. É pegar no telefone e resolver as questões. Tiraram-me uma fotografia muito engraçada: eu a atender três telefones ao mesmo tempo. Foi durante a crise da epidemia da doença dos legionários. Tínhamos dois pisos dedicados a isso, com equipas para cada uma das áreas. Fu estava a falar com uns, tocou outro telefone, e depois há pessoas que a gente tem de atender. Não posso dizer a um ministro "espere aí".
Em 15 anos, teve quantos ministros?
Muitos ministros e primeiros-ministros. Mas se me perguntasse de qual eu era ou fiquei mais próximo, não podia responder. Entrei com Manuela Arcanjo, depois António Correia de Campos e sucessivamente. A todos eles fiquei ligado por razões diferentes. Tenho relações de amizade com o Dr. Paulo Macedo, por exemplo. Estou muito ligado ao meu colega Adalberto, com quem partilhei uma disciplina na Escola Nacional de Saúde Pública e é meu amigo. Todos eles! Em nenhum momento surgiu um bloqueio.
Há um respeito mútuo?
É, provavelmente. Mas não me refiro só às doenças, porque tratamos de muitos assuntos que não têm que ver com isso. A saúde da mãe, da mulher e a saúde reprodutiva, a IVG, por exemplo. E as orientações clínicas dos hospitais, os programas do cancro, a sida, as doenças respiratórias, a alimentação, a luta contra o tabagismo. Há muitas lutas simultâneas.
Há quem o acuse de ser fundamentalista.
Não é verdade.
Fumou, alguma vez?
Fumei em jovem e deixei antes dos 30 anos. Está demonstrado que quem acaba de fumar antes dos 30 não perde anos de vida.
Parou porque sabia isso?
Foi coincidência. Deixei de fumar em 1975 e depois apareceu esse estudo clássico, conduzido em Londres. De maneira que não é por aí que vou precipitar o final da minha vida.
Tem um site onde conta muito sobre a sua vida pessoal e profissional. Sentiu necessidade de falar do passado e das pessoas que o influenciaram?
Editei dois livros e percebi que se desatualizavam. Procurei editar algumas lições que faço na Escola Nacional de Saúde Pública e também se desatualizam. Resolvi fazer este site. Escrevo quando tenho tempo. O último artigo é sobre uma tia-avó, uma das oito portuguesas com 111 anos. A minha condição artística é escrever, não tenho outra vocação. Outros membros da minha família são de belas-artes ou da música.
Como se pronuncia o seu nome?
Nós dizemos Ge-or-ge, porque a minha avó era portuguesa e não sabia falar inglês e o meu avô descobriu uma maneira de contentar todos, que era dizer o nome inglês soletrado em português.
Sempre associei o seu nome a Frederico George, mas não encontrei referência a ele no site.
É irmão do meu pai, estou a escrever agora sobre ele. Chegou a viver em nossa casa quando se divorciou.
Frequentou o mítico ateliê dele?
Sim, ia lá muito. A minha mulher era arquiteta e era discípula dele. Tínhamos uma ligação muito estreita. Esse meu tio era um homem diferente, especial. Um grande artista e um grande pensador. O meu pai era da ciência e esse meu tio era ligado às belas-artes.
Como veio para Portugal o seu avô?
O meu avô Albert fazia a ponte entre os trabalhadores da Carris, uma sociedade inglesa, e a administração. Era um alto funcionário da Carris, e mais tarde veio a ser um pequeno acionista.
Em casa dos seus pais, os filhos todos tinham de contar ao jantar o que se tinha passado.
Isso era obrigatório. Muito inglês. Somos quatro rapazes e a mais nova é uma rapariga, e ia por ordem de idades. Eu tenho um gémeo, que é cinco minutos mais velho do que eu, e esses cinco minutos eram respeitados. Cada um tinha de contar o que se tinha passado e comentar o dia.
Há um momento de corte brutal na sua vida, quando acontece a morte da sua mulher e da sua filha.
É verdade. Foi há dez anos. São tragédias que têm de ser vividas.
Como é que se sobrevive?
Sobrevive-se com luta. Com luta. Com luta. Eu e os meus dois filhos não podíamos mergulhar na depressão, na tristeza, na revolta. É um processo complicado mas que tem de resultar, trabalhando. É um processo permanente, que não acaba. Desde que surge até sempre, sempre. A questão do luto está mal estudada. Às vezes, sou convidado para testemunhos em público. Não gosto muito de fazer isso e não falo da minha vida pessoal, mas sinto que o exemplo tem de ser dado e é preciso lutar pela vida, no sentido de aceitar, compreender e ir em frente. Quando saí do Cemitério Inglês, há dez anos, estava a chuviscar, tinha uma gabardina. À noite, vi que os bolsos da gabardina estavam cheios de comprimidos. As pessoas - amigos, médicos - ao abraçar-me puseram-me comprimidos para dormir no bolso. Deve ser uma tradição. Pus os comprimidos em cima da mesa e disse aos meus filhos: "A partir de hoje ninguém toma comprimidos." Isto é uma história fantástica.
Vai abrir uma nova fase na sua vida, com a candidatura à Organização Mundial da Saúde.
A candidatura não é o Francisco, é de Portugal. A Direção-Geral da Saúde está muito ligada às questões da OMS, desde sempre: somos os interlocutores, com ligações permanentes. Foi uma questão a que o ministro Adalberto deu luz verde, juntamente com o ministro dos Negócios Estrangeiros. Temos uma oportunidade que não é matematicamente certa. É uma eleição, há candidatos de outros países mais fortes. Portugal é muito bem reconhecido pelos progressos que tem feito e, sobretudo, tão rapidamente. Hoje é motivo de estudo internacional pelos avanços, em particular na chamada e-health. Conseguiu recuperar atrasos que vinham desde sempre, sobretudo na análise da informação. Hoje estamos na linha da frente.
Se for para a OMS deixa de ser diretor-geral?
Não é um cargo permanente, são quatro reuniões de cinco dias por ano. É acumulado com o cargo que desempenho atualmente. Caso contrário, não ia fazer isso, porque tenho como objetivo acabar no meu posto e não aceitaria outro desafio de qualquer natureza. É um posto de gestão da organização.
Já falámos de Arnaldo Sampaio, que foi seu mentor. Mas tem mais figuras tutelares na sua vida, e em particular Avelino Cunhal, pai de Álvaro Cunhal.
O Avelino Cunhal foi o meu principal mestre. Disse isto ao ministro da Ciência, o Manuel Heitor, que é filho do diretor do Colégio Valsassina, onde Avelino Cunhal foi meu professor. E ele respondeu-me que muita gente lhe diz o mesmo. Avelino Cunhal foi muito importante na minha formação não só por ser quem era mas, sobretudo, porque ensinava a pensar, a organizar o pensamento. Há quem ponha em causa a importância da filosofia, mas ela organiza o pensamento e põe as pessoas a pensar bem. Isso devo-o a Avelino Cunhal. Fiquei sempre muito ligado ao ensino dele. Era uma pessoa ímpar, em termos de cultura. Grande escritor, um novelista que levou para o teatro o neorrealismo: há um ensaio fantástico, uma peça de teatro sobre a história de uma criada que é acusada de roubar as pérolas da patroa, absolutamente inesquecível. E a figura do filho fez apagar a figura do pai.