A deputada do Bloco de Esquerda e candidata à liderança do partido, Mariana Mortágua assumiu na SIC Notícias que é lésbica e está "preparada para tudo". A revelação foi feita a propósito do mais recente processo judicial que lhe foi movido e que foi arquivado pelo Tribunal Central de Instrução Criminal, iniciativas que a deputada encara como tentativas de "desgaste público".
No arranque do frente a frente "Linhas Vermelhas", com a antiga deputada do CDS-PP, Cecília Meireles, na segunda-feira à noite, a deputada do BE pediu "dois minutos emprestados" para comentar os três processos judiciais que, no último ano, foram movidas contra si, todos arquivados.
"Eu sei que este tipo de pressão e de perseguição política vai continuar e vai até subir de tom e subir de nível", disse Mariana Mortágua, defendendo que "estes processos têm um intuito muito claro que é o desgaste público seja porque no decorrer destes processos a comunicação social vai dando nota que eles acontecem, mesmo que o seu desfecho seja o arquivamento".
"Seja porque eu sou mulher, seja porque sou de esquerda, seja porque sou uma mulher lésbica, seja porque sou filha de um resistente antifascista, com um passado e uma importante história, seja porque aparentemente tenho o dom de incomodar algumas pessoas com muito poder. E eu sei que, para algumas pessoas, nos dias que correm, vale tudo na política, e a mim resta-me dizer que estou preparada para tudo. Vou continuar a ser quem sou e a fazer exatamente o meu trabalho como tenho feito até aqui", disse, passando depois a comentar as mais recentes revelações da comissão parlamentar de inquérito à TAP, onde tem assento.
Recorde-se que, na passada sexta-feira, o Tribunal Central de Instrução Criminal (TCIC) decidiu arquivar o processo contra Mariana Mortágua, no qual a deputada do BE era acusada de violar o regime de exclusividade por fazer comentário político na SIC Notícias.
O que disse a juíza
"Decide-se julgar totalmente improcedentes os requerimentos apresentados pelos assistentes e, consequentemente: não pronunciar a arguida pela prática de um crime de peculato (...) e pela prática de um crime de recebimento indevido de vantagem", lê-se na decisão instrutória, assinada pela juíza Gabriela Assunção, a que a Lusa teve acesso.
Segundo a fundamentação da magistrada do TCIC, a candidata à liderança bloquista não tinha obrigação de conhecer a alteração do entendimento da Comissão de Transparência e Estatuto dos Deputados sobre esta matéria, em fevereiro de 2020, uma vez que não estava, então, a fazer comentário televisivo.
"É plausível, como conclui o Ministério Público, que não soubesse que o entendimento da Comissão de Transparência e Estatuto dos Deputados tinha mudado - e não há nenhum indício de que sabia - e destaca-se que, ao saber, desde logo por se ter tornado pública a sua situação irregular, diligenciou pela imediata restituição das quantias recebidas", referiu, acrescentando que não se vislumbram indícios de dolo na conduta de Mariana Mortágua.
Para a juíza de instrução, o facto de os queixosos terem imputado peculato e recebimento indevido de vantagem "é manifestamente contraditório", considerando que Mariana Mortágua não poderia apropriar-se de forma ilícita das quantias e, ao mesmo tempo, pedir ou aceitar uma vantagem patrimonial com esta situação.
"Além do mais, e confirmando que esta sua conduta assume, na verdade, contornos bagatelares e que não suscita a intervenção do sistema penal, nota-se que sempre seria a arguida dispensada de pena", finalizou, assinalando ainda o fim da medida de coação de termo de identidade e residência para a deputada.
Outros casos
No passado, outros políticos portugueses também já vieram a público assumir a sua homossexualidade, casos da antiga ministra da Cultura, Graça Fonseca, do atual secretário de Estado da Presidência do Conselho de Ministros, André Moz Caldas, ou do ex-vice-presidente do CDS-PP e ex-secretário de Estado do Turismo no Governo PSD/CDS-PP, Adolfo Mesquita Nunes, que viu o tema da sua orientação sexual entrar na campanha eleitoral autárquica de 2017 em que foi candidato à Covilhã.